O REAVIVAMENTO DO ESTADO BURGUÊS DURANTE A GUERRA CIVIL ESPANHOLA
1 -A Contra-Revolução Económica (Setembro de 1936 - Abril de 1937)
Durante os oito meses, depois que os representantes dos operários entraram nos ministérios em Madrid e Barcelona, as conquistas proletárias no campo económico foram pouco a pouco alteradas. Pelo controle dos bancos e da tesouraria, o governo podia impor a sua vontade aos operários, sob a ameaça de sustar os créditos.
Na Catalunha, principal centro industrial, o processo foi mais vagaroso mas tendeu para o mesmo fim. Uns cinquenta e oito decretos financeiros da Generalidad, em Janeiro, restringiram consideravelmente o âmbito da actividade das fábricas colectivizadas. A 3 de Fevereiro, pela primeira vez, a Generalidad ousou decretar que era ilegal a colectivização de uma indústria: a dos produtos lácteos.
Durante a crise ministerial de Abril, a Generalidad anulou o controle operário das alfândegas, recusando considerar propriedade dos operários os artigos de exportação que estavam a ser arrastados pelos tribunais estrangeiros devido a protestos dos antigos proprietários; daí por diante, as fábricas e colectividades agrícolas que exportavam artigos ficaram à mercê do governo.
Comorera, dirigente do PSUC, encarrega-se do Ministério dos Abastecimentos, a 15 de Dezembro, quando o POUM foi expulso do ministério. A 7 de Janeiro decretou a dissolução das comissões proletárias de abastecimentos que tinham estado a comprar alimentos dos camponeses. Para esta brecha avançaram os especuladores e negociantes da CEPCI (Corporação e Uniões de Pequenos Comerciantes e Manufactureiros) - com cartões da UGT! E deu-se o açambarcamento de géneros e aumento de preços, com a subquente carência alimentar da população. Cada família recebia cartões de racionamento mas os abastecimentos não eram racionados na proporção das pessoas servidas por cada armazém. Nos subúrbios operários de Barcelona longas bichas permaneciam de pé durante todo o dia, os géneros acabavam antes de acabar as bichas, ao passo que nos distritos burgueses havia a abundância. Os restaurantes nas mãos de particulares tinham abundantes fornecimentos para os que pudessem pagar o respectivo preço. Não se podia obter leite para os filhos dos operários mas existia nos restaurantes. Embora não se pudesse obter pão (a preço fixo), era sempre possível comprar bolos (a preço livre).
No sexto aniversário da república (14 de Abril, boicotado pela FAI, CNT, POUM) as manifestações de Esquerda e dos Estalinistas foram excedidas pelas manifestações das mulheres contra o preço dos alimentos. Entretanto, os Estalinistas deram mesmo utilização política, até aos seus crimes. Deram a compreender às massas que os membros do PSUC e da UGT teriam melhores racionamentos. Anónimos cartazes acusavam as herdades e os transportes colectivizados como causa da subida dos preços.
Vicente Uribe, Ministro da Agricultura, Estalinista, desempenhou aqui o mesmo papel que o Ministro Estalinista da Agricultura desempenhara no regime Wang Ching-Wei de 1927, em Wuhan, no combate aos camponeses. O gabinete de Uribe desmantelou os colectivos, organizou os antigos proprietários, a quem foram restituídas as suas terras, na qualidade de "co-administradores" da indústria estabeleceu as bases para arrancar todo o controle das mãos das comissões fabris.
Entretanto, comparativamente, a contra-revolução económica avançava com lentidão, porque o bloco burguês - Estalinista compreendia - o que não aconteceu aos anarquistas - que as condições prévias necessárias para destruir as conquistas económicas eram o esmagamento das milícias e da polícia proletárias e o desarmamento dos operários na rectaguarda. Mas só a força era insuficiente para atingir o fim. A força tinha de ser combinada com a propaganda.
2 - Censura
Para facilitar o êxito da sua própria propaganda, o bloco burguês-reformista recorreu, através do governo, à sistemática mutilação da imprensa e da rádio das CNT-FAI-POUM.
O POUM foi a principal vítima. Quando ainda estava na Generalidad, a Hoja Official catalã boicotou toda a menção de reuniões e emissões do POUM. Em 26 de Fevereiro, a Generalidad proibiu uma reunião maciça da CNT-POUM em Tarragona. Em 5 de março, La Batalla foi multada em 5000 pesetas por desobediência ao censor militar. Em 14 de Março, o mesmo jornal foi suspenso durante quatro dias, desta vez com uma acusação determinada, resultante de um artigo de fundo sobre política. Ao mesmo tempo, a Generalidad recusava ao POUM a utilização da estação oficial da rádio. Os jornais do POUM em Lérida e Gerona, etc, foram constantemente atacados.
Contudo, o golpe mais severo contra o POUM foi dado fora da Catalunha. A Junta de Defesa de Madrid, controlada pelos Estalinistas, suspendeu em 10 de Fevereiro (e confiscou) a saída de El Combatiente Rojo, diário da milícia POUM, e, pouco depois, suspendeu a estação de rádio do POUM, fechando-a definitivamente em Abril. A Junta recusou também permissão à juventude POUM (Juventude Comunista Ibérica) para publicar La Antorcha; a proibição oficial declarava que " a JCI não precisava de imprensa. Juventud Roja, orgão da juventude POUM em Valência, foi sujeito a severa censura política em março. O único orgão POUM incólume foi o El Comunista de Valência, semanário ferozmente anti-Trotskista e meio-Estalisnista da ala direita.
Outro importante campo de trabalho entre as massas foi fechado ao POUM quando o Auxílio Vermelho POUM foi excluído da Comissão Permanente de Auxílio a Madrid, a pedido do PSUC. A CNT, em nome da unidade, concordou com esta acto criminoso, que se tornou de âmbito nacional em Abril, quando o Auxílio Vermelho POUM foi excluído de participar na Semana de Madrid.
Este esquema da colocação do POUM na ilegalidade, por parte do governo, antes de Maio, refuta impressionantemente a pretensão Estalinista de o POUM ser perseguido pela sua participação nos acontecimentos de Maio.
A censura contra o POUM foi executada por ministérios da CNT. Só a Juventude Anarquista e a Juventude Libertária protestaram publicamente. Mas a imprensa da CNT foi também sistematicamente hostilizada. Haverá porventura registo histórico de outro exemplo de ministério, com ministros que submetam à repressão a sua própria imprensa?
O jornal diário da FAI, Nosotros, de Valência, ficou suspenso indefinitivamente em 27 de Fevereiro por ter publicado um artigo de ataque à polícia bélica de Caballero. A 26 de Março, o Governo Basco suspendeu o jornal da CNT, Del Norte, prendeu o corpo redactorial e a Comissão Regional da CNT e entregou as tipografias ao Partido Comunista Basco. Várias publicações da CNT e Castilla Libre, de Madrid, foram suspensos em 11-18 de Abril. Nosostros voltou a ser suspenso em 16 de Abril.
Censura e suspensão eram medidas eficazes. Eram pelo menos igualmente eficazes as medidas pelas quais pacotes de jornais da CNT-FAI-POUM não podiam chegar à frente de combate ou chegavam semanas mais tarde. Entretanto enormes edições da imprensa burguesa e estalinista, nunca atacadas pela censura e sempre entregues, eram distribuídas às milícias da CNT, UGT e POUM. As estações governamentais da rádio estavam sempre ao serviço dos Nelkens e Passionárias. Quase todos os comissários políticos na frente eram Estalinistas e burgueses. Deste modo, a fraude era um suplemento da força.
3 - A Polícia
Nos primeiros meses após 19 de Julho, as actividades policiais estavam nas mãos das patrulhas proletárias na Catalunha, e das "milícias da retaguarda" em Madrid e Valência. Mas falhou sempre a oportunidade de dissolver a polícia burguesa.
Sob Caballero, a Guarda Civil recebeu o nome de Guarda nacional Republicana. Os restos desta e as Guardas de Assalto foram gradualmente retirados da frente de combate. Os que se tinham passado para Franco foram mais do que os substituídos por novos homens.
O passo mais extraordinário no reavivamento da polícia burguesa foi o repentino crescimento da força alfandegária até ai pequena - os Carabineros - sob Negrin, Ministro das Finanças, que se transformou numa guarda pretoriana de 40.000 homens, pesadamente armados.
A 28 de Fevereiro, foi proibido que os Carabineros pertencessem a qualquer partido político, ou união proletária, ou assistissem a reuniões de massas. O mesmo decreto foi extensivo aos Guardas Civis e Guardas de Assalto. Isto significava a quarentena da polícia contra a classe proletária. Os ministros anarquistas, desesperadamente desorientados, votaram a favor desta medida, crentes de que ela sustaria o proselitismo Estalinista.
Em Abril, as milícias foram finalmente despojadas de todas as actividades policiais em Madrid e Valência. Na fortaleza proletária da Catalunha, este processo encontrou oposição decidida das massas da CNT. Deu-se também um incidente que retardou o esquema burguês. Provou-se que o primeiro Chefe da Polícia de toda a Catalunha era um dos cabecilhas numa conspiração para assassinar os dirigentes da CNT, estabelecer uma Catalunha Independente e fazer a paz separada com Franco. Este escândalo fortaleceu a posição das patrulhas proletárias largamente dominadas pela CNT.
Mas logo de seguida as patrulhas foram atacadas pelo lado de dentro. O PSUC ordenou aos seus membros que se retirassem das patrulhas (os que não se retiraram foram expulsos). O Esquerra também se retirou das patrulhas. Depois, todos os usuais métodos Estalinistas de difamação foram dirigidos contra as patrulhas, mais fortemente quando esta prenderam comerciantes do PSUC e do CEPCI por açambarcamento e por excesso de lucros em alimentos.
Em 1 de março, um decreto da Generalidad unificou toda a polícia numa simples corporação controlada pelo Estado, proibiu que os seus membros se associassem nas uniões proletárias e nos partidos e prometeu que seriam escolhidos por antiguidade. Isto significava a abolição das patrulhas proletárias e impedia aos seus membros pertencer à polícia unificada. A parentemente, os ministros da CNT votaram a favor deste decreto, mas o clamor das massas catalãs levou a CNT a ligar-se ao POUM, declarando que se recusariam a obedecer-lhe. Contudo, a 15 de março, o Ministro da Ordem Pública, Jaime Ayguade, tentou sem êxito suprimir à força as patrulhas proletárias nos distritos fora de Barcelona. Este assunto foi um dos que levaram o ministério catalão à sua dissolução em 27 de Março. Mas não houve mudança quando o novo ministério, outra vez com ministros da CNT, teve uma reunião a 16 de Abril. Ayguade continuou as suas tentativas para desarmar as patrulhas, enquanto os ministros da CNT no gabinete se contentavam com os seus papéis de aviso aos operários para evitarem provocações.
4 - Liquidação das Milícias
Sem dúvida que não podia haver qualquer esperança de reavivar um estável regime burguês enquanto a responsabilidade da organização e administração das forças armadas estivesse nas mãos das uniões e partidos proletários que apresentavam o rol de pagamentos e requisições, etc., aos governos de Madrid e da Catalunha e se erguiam as milícias e os governos.
Os Estalinistas cedo procuraram dar um exemplo, pondo as suas milícias sob o controle do governo, ajudando a restabelecer a continência e a supremacia dos oficiais nas linhas. "Nada de discussões nem de política no exército", clamava a imprensa Estalinista, querendo dizer sem dúvida que não devia haver discussões ou política dentro da classe operária.
O exemplo não surtiu efeito nas massas da CNT. Pelo menos um terço das forças armadas era de membros da CNT, suspeitosos dos oficiais enviados pelo governo, relegando-os para a situação de "técnicos" e impedindo-os de intervir na vida social e política das milícias. O POUM tinha 10.000 milicianos que agiam de igual maneira. O POUM reimprimiu para distribuição nas milícias o primitivo Manual do Exército Vermelho, de Trotsky, dando ao exército vida política. A campanha Estalinista para suprimir a vida interna democrática das milícias, sob a senha de "comando unificado", chocou perante a simples e irrespondível pergunta: por que razão o comando unificado necessita de restabelecer o velho regime de quartel e a supremacia de uma casta de oficiais burgueses?
Mas o governo encontrou eventualmente o seu caminho. Os decretos de militarização e mobilização, publicados em Setembro e Outubro com o consentimento da CNT e POUM; indicavam o recrutamento de regimentos regulares dominados pelo velho código militar. Sistemática selecção de candidatos para as escolas de oficiais deu preponderância à burguesia e aos Estalinistas e foram estes que passaram a dirigir os novos regimentos.
Quando as primeiras mobilizações do novo exército estavam prontas e foram mandadas para a frente, o governo po-las em competição com as milícias, exigindo a reorganização destas sob o mesmo modelo. Em Março, o governo tinha obtido grande êxito na frente de Madrid, controlada pelos Estalinistas. Nas frentes de Aragão e do Levante, dominadas principalmente pelas milícias da CNT-FAI e POUM, o governo preparou a liquidação das milícias por meio de uma política implacável e sistemática de reter os armamentos. As milícias foram informadas de que, só depois de reorganizadas, receberiam aramas adequadas a uma ofensiva naquelas frentes. Contudo, as massas puras das milícias da CNT impediram que o governo alcançasse os seus objectivos até depois de Maio, quando o Ex-Ministro da Guerra de Azanã, General Pozas, assumiu o comando da frente de Aragão.
Em última análise, porém, o êxito final do governo não veio dos seus próprios esforços, mas sim do carácter politicamente falso do CNT-POUM, ao pedir um "comando unificado sob o controle das organizações proletárias".
Os Estalinistas e os seus publicistas "fora do partido" como Louis Fisher e Ralph Bates, preverteram deliberadamente os factos da controvérsia entre o POUM-CNT e o governo, sobre a reorganização do exército. Os Estalinistas fizeram correr que o POUM-CNT queria manter as milícias frouxamente organizadas em vez de um exército eficientemente centralizado. Isto era uma completa mentira, como se pode demonstrar por milhares de artigos na imprensa de POUM-CNT, quando pedia um exército disciplinado sob comando unificado. O problema real estava nisto: quem dominaria o exército - a burguesia, ou a classe operária? E não era só o POUM-CNT que fazia esta pergunta. No esquema oposto, da Giral, para um exército especial, o orgão da UGT, Claridad, declarava: "Devemos ter todo o cuidado em que as massas e a direcção das forças armadas, que, acima de tudo, têm de ser todo o povo em armas, não nos venham a escapar das mãos" (20 de Agosto de 1936).
Este era o problema real. A burguesia ganhou porque a UGT, o POUM e as CNT-FAI cometeram o desgraçado erro de procurar um exército controlado pelos proletários, dentro de um Estado burguês. A prova de que estavam a favor da centralização e de um comando unificado é que aprovaram os decretos governamentais que, nos meses seguintes, serviram para suprimir o controle proletário do exército. A UGT, o POUM e a CNT, quando deram o seu consentimento a estes decretos, cometeram um crime nada menor, contra a classe operária.
A determinação a favor de um comando unificado sob controle das organizações operárias era falsa porque não fornecia nenhum método para atingir tal objectivo. O pedido que devia ter surgido desde o primeiro dia da guerra seria agrupar todas as milícias e os poucos regimentos existentes numa única força, com eleição democrática das comissões de soldados um em cada unidade, centralizadas numa eleição nacional. Quando novos regimentos fossem mobilizados, as comissões dos seus soldados teriam entrado nos conselhos locais e nacionais. Deste modo, introduzindo as massas armadas na vida política diária, teria sido realmente evitado o controle burguês das forças armadas.
O POUM teve uma admirável oportunidade de demonstrar a eficácia deste método. Na frente de Aragão, durante oito meses, teve o controle directo e organizacional sobre 9.000 milicianos. E teve uma oportunidade única de os educar politicamente e de eleger comissões de soldados, como exemplo para o resto das milícias, e pedir depois um agrupamento em que as suas forças treinadas teriam sido um poderoso fermento. Nada se fez. A imprensa do POUM publicou histórias sobre representantes da frente aragonesa reunidos em congresso. Tais reuniões não passaram de pequenos grupos, porquanto, de facto, o POUM proibiu a eleição de comissões de soldados. Porquê? Entre outras razões pelo facto de ser predominante nas fileiras a oposição aos políticos oportunistas do POUM, e a burocracia temer que a criação das comissões desse lugar a que a Oposição Esquerdista obtivesse uma vitória.
As comissões de soldados era a via única para assegurar o controle proletário do exército. Contudo, só poderia ser um passo transitório. Porque um exército controlado por operários não poderia existir indefinitivamente lado a lado com o Estado burguês. Se o Estado burguês continuasse a existir, destruiria inevitavelmente o controle proletário do exército.
Os proponentes do controle proletário, pertencentes aos POUM-CNT-UGT, jamais apresentaram um programa concreto para deslocar o Estado burguês. Portanto, a sua orientação reduziu à impotência a oposição ao domínio burguês do exército.
5 - Desarmamento dos Operários na Retaguarda
Nos dias da revolução a seguir ao 19 de Julho, os governos de Madrid e da Catalunha tiveram de sancionar o armamento dos operários que já se tinham armado. Organizações proletárias obtiveram licenças de porte de armas para os seus membros. Para os operários, não era só uma questão de se pouparem às tentativas contra-revolucionárias do governo, mas era também a necessidade diária de proteger as comissões de camponeses contra os reaccionários, de proteger contra os bandos fascistas as fábricas, as vias férreas, pontes, costas, descobrir ninhos fascistas escondidos.
Em Outubro veio o primeiro decreto de desarmamento, impondo a entrega de todas as carabinas e metralhadoras ao governo. Na prática, isto foi interpretado como determinação às organizações proletárias para entregarem as licenças de porte de armas aos guardas das indústrias e às comissões rurais. Mas estabeleceu um fatal precedente.
Em 15 de Fevereiro, o governo central ordenou o confisco de todas as armas de grande e pequeno porte que não tivessem licença. Em 12 de Março, o governo ordenou as organizações proletárias que reunissem as armas grandes e pequenas dos seus membros e as entregassem no prazo de quarenta e oito horas. Os Guardas Nacionais Republicanos começaram a desarmar os operários que encontravam nas ruas de Barcelona. Trezentos operários - membros das CNT com licenças de organização - foram assim desarmados pela polícia durante a última semana de Abril.
O pretexto de que as armas eram precisas na frente de batalha era uma descarada mentira, como estava bem à vista de todos os operários; enquanto estes estavam a ser privados de carabinas e revólveres - alguns na posse na CNT desde os dias da monarquia - as cidades estavam a encher-se de forças da polícia reorganizada, armada até aos dentes com as novas carabinas russas, metralhadoras, artilharia e carros de combate.
6 - Métodos Extra-legais de Repressão: A G.P.U Espanhola
Em 17 de Dezembro de 1936, o Pravda, jornal de Estaline, declarava: "Quanto à Catalunha, a purga dos Trotskistas e Anarco-sindicalistas começou; será com a mesma energia com que foi conduzida na U.R.S.S."
Os métodos legais, que eram demasiado vagarosos, foram acrescidos por bandos organizados de terroristas, equipados com prisões privativas e salas de tortura, chamadas "preventórios". Os lacaios recrutados para este trabalho exigem uma descrição: ex-membros da fascista CEDA, gangsters cubanos, chulos de lupanares, forjadores de passaportes, sádicos. Saídas da composição burguesa do Partido Comunista, alimentadas pelo seu programa contra-revolucionário, as quadrilhas organizadas da G.P.U. espanhola tiveram para os operários a ferocidade dos sabujos de Hitler, porque foram treinadas para exterminar a revolução.
Em Abril de 1937, Rodriguez, membro da CNT e Comissário Especial das prisões, encarregou formalmente José Cazorla, membro da Comissão Central Estalinista e Chefe de Polícia sob a Junta de Madrid, e Santiago Carrillo, outro membro daquela Comissão Central, de se apoderarem ilegalmente de operários presos por Cazorla, mas absolvidos pelos tribunais populares, e "levarem os mesmos absolvidos para prisões secretas ou para os batalhões de milícia comunista nas frentes avançadas, onde seriam usados como "fortificações". A CNT em vão pediu rigorosa investigação destas acusações. Só quando se verificou que a quadrilha de Cazorla estava a trabalhar (em extra-programa) com chantagistas que punham em liberdade importantes fascistas, sem sanção oficial, só então Cazorla foi demitido. Mas foi simplesmente substituído por Carrillo, outro Estalinista, e a G.P.U. extra-legal e as prisões privativas continuaram como dantes.
"Está a tornar-se bem claro que as organizações da "Cheka", recentemente descobertas em Madrid, estão directamente ligadas com centros análogos que operam sob uma direcção unificada e com um plano preconcebido de âmbito nacional", Solidaridad Obrera, 25 de Abril de 1937.
Em 8 de Abril , a CNT, armada de provas, forçou finalmente a prisão da quadrilha Estalinista em Múrcia e exigiu a demissão do Governador Civil por manter prisões privativas e salas de tortura. Em 15 de Março, dezasseis membros da CNT tinham sido assassinados pelos Estalinistas em Villanueva de Alcardete, na província de Toledo. O pedido da CNT por um castigo exemplar foi contraditado pela defesa de Mundo Obrero, sob a alegação de que os assassinos eram antifascistas revolucionários. Uma investigação judicial posterior estabeleceu que toda uma quadrilha Estalinista, incluindo os maioriais do Partido Comunista de Villanueva e de Villamayor, operando como "Comissão de Defesa", tinha assassinado inimigos políticos, saqueado, imposto tributos, violado mulheres indefesas daquela área. Cinco dos Estalinistas foram condenados à morte e outros oito a penas de prisão.
O banditismo organizado da G.P.U. espanhola ficou provado pelos próprios tribunais do Governo Espanhol. Mas a imprensa da CNT está cheia de centenas de exemplos em que a contra-revolução "legal" foi auxiliada pela G.P.U. espanhola.
Inédito, 1995
1 -A Contra-Revolução Económica (Setembro de 1936 - Abril de 1937)
Durante os oito meses, depois que os representantes dos operários entraram nos ministérios em Madrid e Barcelona, as conquistas proletárias no campo económico foram pouco a pouco alteradas. Pelo controle dos bancos e da tesouraria, o governo podia impor a sua vontade aos operários, sob a ameaça de sustar os créditos.
Na Catalunha, principal centro industrial, o processo foi mais vagaroso mas tendeu para o mesmo fim. Uns cinquenta e oito decretos financeiros da Generalidad, em Janeiro, restringiram consideravelmente o âmbito da actividade das fábricas colectivizadas. A 3 de Fevereiro, pela primeira vez, a Generalidad ousou decretar que era ilegal a colectivização de uma indústria: a dos produtos lácteos.
Durante a crise ministerial de Abril, a Generalidad anulou o controle operário das alfândegas, recusando considerar propriedade dos operários os artigos de exportação que estavam a ser arrastados pelos tribunais estrangeiros devido a protestos dos antigos proprietários; daí por diante, as fábricas e colectividades agrícolas que exportavam artigos ficaram à mercê do governo.
Comorera, dirigente do PSUC, encarrega-se do Ministério dos Abastecimentos, a 15 de Dezembro, quando o POUM foi expulso do ministério. A 7 de Janeiro decretou a dissolução das comissões proletárias de abastecimentos que tinham estado a comprar alimentos dos camponeses. Para esta brecha avançaram os especuladores e negociantes da CEPCI (Corporação e Uniões de Pequenos Comerciantes e Manufactureiros) - com cartões da UGT! E deu-se o açambarcamento de géneros e aumento de preços, com a subquente carência alimentar da população. Cada família recebia cartões de racionamento mas os abastecimentos não eram racionados na proporção das pessoas servidas por cada armazém. Nos subúrbios operários de Barcelona longas bichas permaneciam de pé durante todo o dia, os géneros acabavam antes de acabar as bichas, ao passo que nos distritos burgueses havia a abundância. Os restaurantes nas mãos de particulares tinham abundantes fornecimentos para os que pudessem pagar o respectivo preço. Não se podia obter leite para os filhos dos operários mas existia nos restaurantes. Embora não se pudesse obter pão (a preço fixo), era sempre possível comprar bolos (a preço livre).
No sexto aniversário da república (14 de Abril, boicotado pela FAI, CNT, POUM) as manifestações de Esquerda e dos Estalinistas foram excedidas pelas manifestações das mulheres contra o preço dos alimentos. Entretanto, os Estalinistas deram mesmo utilização política, até aos seus crimes. Deram a compreender às massas que os membros do PSUC e da UGT teriam melhores racionamentos. Anónimos cartazes acusavam as herdades e os transportes colectivizados como causa da subida dos preços.
Vicente Uribe, Ministro da Agricultura, Estalinista, desempenhou aqui o mesmo papel que o Ministro Estalinista da Agricultura desempenhara no regime Wang Ching-Wei de 1927, em Wuhan, no combate aos camponeses. O gabinete de Uribe desmantelou os colectivos, organizou os antigos proprietários, a quem foram restituídas as suas terras, na qualidade de "co-administradores" da indústria estabeleceu as bases para arrancar todo o controle das mãos das comissões fabris.
Entretanto, comparativamente, a contra-revolução económica avançava com lentidão, porque o bloco burguês - Estalinista compreendia - o que não aconteceu aos anarquistas - que as condições prévias necessárias para destruir as conquistas económicas eram o esmagamento das milícias e da polícia proletárias e o desarmamento dos operários na rectaguarda. Mas só a força era insuficiente para atingir o fim. A força tinha de ser combinada com a propaganda.
2 - Censura
Para facilitar o êxito da sua própria propaganda, o bloco burguês-reformista recorreu, através do governo, à sistemática mutilação da imprensa e da rádio das CNT-FAI-POUM.
O POUM foi a principal vítima. Quando ainda estava na Generalidad, a Hoja Official catalã boicotou toda a menção de reuniões e emissões do POUM. Em 26 de Fevereiro, a Generalidad proibiu uma reunião maciça da CNT-POUM em Tarragona. Em 5 de março, La Batalla foi multada em 5000 pesetas por desobediência ao censor militar. Em 14 de Março, o mesmo jornal foi suspenso durante quatro dias, desta vez com uma acusação determinada, resultante de um artigo de fundo sobre política. Ao mesmo tempo, a Generalidad recusava ao POUM a utilização da estação oficial da rádio. Os jornais do POUM em Lérida e Gerona, etc, foram constantemente atacados.
Contudo, o golpe mais severo contra o POUM foi dado fora da Catalunha. A Junta de Defesa de Madrid, controlada pelos Estalinistas, suspendeu em 10 de Fevereiro (e confiscou) a saída de El Combatiente Rojo, diário da milícia POUM, e, pouco depois, suspendeu a estação de rádio do POUM, fechando-a definitivamente em Abril. A Junta recusou também permissão à juventude POUM (Juventude Comunista Ibérica) para publicar La Antorcha; a proibição oficial declarava que " a JCI não precisava de imprensa. Juventud Roja, orgão da juventude POUM em Valência, foi sujeito a severa censura política em março. O único orgão POUM incólume foi o El Comunista de Valência, semanário ferozmente anti-Trotskista e meio-Estalisnista da ala direita.
Outro importante campo de trabalho entre as massas foi fechado ao POUM quando o Auxílio Vermelho POUM foi excluído da Comissão Permanente de Auxílio a Madrid, a pedido do PSUC. A CNT, em nome da unidade, concordou com esta acto criminoso, que se tornou de âmbito nacional em Abril, quando o Auxílio Vermelho POUM foi excluído de participar na Semana de Madrid.
Este esquema da colocação do POUM na ilegalidade, por parte do governo, antes de Maio, refuta impressionantemente a pretensão Estalinista de o POUM ser perseguido pela sua participação nos acontecimentos de Maio.
A censura contra o POUM foi executada por ministérios da CNT. Só a Juventude Anarquista e a Juventude Libertária protestaram publicamente. Mas a imprensa da CNT foi também sistematicamente hostilizada. Haverá porventura registo histórico de outro exemplo de ministério, com ministros que submetam à repressão a sua própria imprensa?
O jornal diário da FAI, Nosotros, de Valência, ficou suspenso indefinitivamente em 27 de Fevereiro por ter publicado um artigo de ataque à polícia bélica de Caballero. A 26 de Março, o Governo Basco suspendeu o jornal da CNT, Del Norte, prendeu o corpo redactorial e a Comissão Regional da CNT e entregou as tipografias ao Partido Comunista Basco. Várias publicações da CNT e Castilla Libre, de Madrid, foram suspensos em 11-18 de Abril. Nosostros voltou a ser suspenso em 16 de Abril.
Censura e suspensão eram medidas eficazes. Eram pelo menos igualmente eficazes as medidas pelas quais pacotes de jornais da CNT-FAI-POUM não podiam chegar à frente de combate ou chegavam semanas mais tarde. Entretanto enormes edições da imprensa burguesa e estalinista, nunca atacadas pela censura e sempre entregues, eram distribuídas às milícias da CNT, UGT e POUM. As estações governamentais da rádio estavam sempre ao serviço dos Nelkens e Passionárias. Quase todos os comissários políticos na frente eram Estalinistas e burgueses. Deste modo, a fraude era um suplemento da força.
3 - A Polícia
Nos primeiros meses após 19 de Julho, as actividades policiais estavam nas mãos das patrulhas proletárias na Catalunha, e das "milícias da retaguarda" em Madrid e Valência. Mas falhou sempre a oportunidade de dissolver a polícia burguesa.
Sob Caballero, a Guarda Civil recebeu o nome de Guarda nacional Republicana. Os restos desta e as Guardas de Assalto foram gradualmente retirados da frente de combate. Os que se tinham passado para Franco foram mais do que os substituídos por novos homens.
O passo mais extraordinário no reavivamento da polícia burguesa foi o repentino crescimento da força alfandegária até ai pequena - os Carabineros - sob Negrin, Ministro das Finanças, que se transformou numa guarda pretoriana de 40.000 homens, pesadamente armados.
A 28 de Fevereiro, foi proibido que os Carabineros pertencessem a qualquer partido político, ou união proletária, ou assistissem a reuniões de massas. O mesmo decreto foi extensivo aos Guardas Civis e Guardas de Assalto. Isto significava a quarentena da polícia contra a classe proletária. Os ministros anarquistas, desesperadamente desorientados, votaram a favor desta medida, crentes de que ela sustaria o proselitismo Estalinista.
Em Abril, as milícias foram finalmente despojadas de todas as actividades policiais em Madrid e Valência. Na fortaleza proletária da Catalunha, este processo encontrou oposição decidida das massas da CNT. Deu-se também um incidente que retardou o esquema burguês. Provou-se que o primeiro Chefe da Polícia de toda a Catalunha era um dos cabecilhas numa conspiração para assassinar os dirigentes da CNT, estabelecer uma Catalunha Independente e fazer a paz separada com Franco. Este escândalo fortaleceu a posição das patrulhas proletárias largamente dominadas pela CNT.
Mas logo de seguida as patrulhas foram atacadas pelo lado de dentro. O PSUC ordenou aos seus membros que se retirassem das patrulhas (os que não se retiraram foram expulsos). O Esquerra também se retirou das patrulhas. Depois, todos os usuais métodos Estalinistas de difamação foram dirigidos contra as patrulhas, mais fortemente quando esta prenderam comerciantes do PSUC e do CEPCI por açambarcamento e por excesso de lucros em alimentos.
Em 1 de março, um decreto da Generalidad unificou toda a polícia numa simples corporação controlada pelo Estado, proibiu que os seus membros se associassem nas uniões proletárias e nos partidos e prometeu que seriam escolhidos por antiguidade. Isto significava a abolição das patrulhas proletárias e impedia aos seus membros pertencer à polícia unificada. A parentemente, os ministros da CNT votaram a favor deste decreto, mas o clamor das massas catalãs levou a CNT a ligar-se ao POUM, declarando que se recusariam a obedecer-lhe. Contudo, a 15 de março, o Ministro da Ordem Pública, Jaime Ayguade, tentou sem êxito suprimir à força as patrulhas proletárias nos distritos fora de Barcelona. Este assunto foi um dos que levaram o ministério catalão à sua dissolução em 27 de Março. Mas não houve mudança quando o novo ministério, outra vez com ministros da CNT, teve uma reunião a 16 de Abril. Ayguade continuou as suas tentativas para desarmar as patrulhas, enquanto os ministros da CNT no gabinete se contentavam com os seus papéis de aviso aos operários para evitarem provocações.
4 - Liquidação das Milícias
Sem dúvida que não podia haver qualquer esperança de reavivar um estável regime burguês enquanto a responsabilidade da organização e administração das forças armadas estivesse nas mãos das uniões e partidos proletários que apresentavam o rol de pagamentos e requisições, etc., aos governos de Madrid e da Catalunha e se erguiam as milícias e os governos.
Os Estalinistas cedo procuraram dar um exemplo, pondo as suas milícias sob o controle do governo, ajudando a restabelecer a continência e a supremacia dos oficiais nas linhas. "Nada de discussões nem de política no exército", clamava a imprensa Estalinista, querendo dizer sem dúvida que não devia haver discussões ou política dentro da classe operária.
O exemplo não surtiu efeito nas massas da CNT. Pelo menos um terço das forças armadas era de membros da CNT, suspeitosos dos oficiais enviados pelo governo, relegando-os para a situação de "técnicos" e impedindo-os de intervir na vida social e política das milícias. O POUM tinha 10.000 milicianos que agiam de igual maneira. O POUM reimprimiu para distribuição nas milícias o primitivo Manual do Exército Vermelho, de Trotsky, dando ao exército vida política. A campanha Estalinista para suprimir a vida interna democrática das milícias, sob a senha de "comando unificado", chocou perante a simples e irrespondível pergunta: por que razão o comando unificado necessita de restabelecer o velho regime de quartel e a supremacia de uma casta de oficiais burgueses?
Mas o governo encontrou eventualmente o seu caminho. Os decretos de militarização e mobilização, publicados em Setembro e Outubro com o consentimento da CNT e POUM; indicavam o recrutamento de regimentos regulares dominados pelo velho código militar. Sistemática selecção de candidatos para as escolas de oficiais deu preponderância à burguesia e aos Estalinistas e foram estes que passaram a dirigir os novos regimentos.
Quando as primeiras mobilizações do novo exército estavam prontas e foram mandadas para a frente, o governo po-las em competição com as milícias, exigindo a reorganização destas sob o mesmo modelo. Em Março, o governo tinha obtido grande êxito na frente de Madrid, controlada pelos Estalinistas. Nas frentes de Aragão e do Levante, dominadas principalmente pelas milícias da CNT-FAI e POUM, o governo preparou a liquidação das milícias por meio de uma política implacável e sistemática de reter os armamentos. As milícias foram informadas de que, só depois de reorganizadas, receberiam aramas adequadas a uma ofensiva naquelas frentes. Contudo, as massas puras das milícias da CNT impediram que o governo alcançasse os seus objectivos até depois de Maio, quando o Ex-Ministro da Guerra de Azanã, General Pozas, assumiu o comando da frente de Aragão.
Em última análise, porém, o êxito final do governo não veio dos seus próprios esforços, mas sim do carácter politicamente falso do CNT-POUM, ao pedir um "comando unificado sob o controle das organizações proletárias".
Os Estalinistas e os seus publicistas "fora do partido" como Louis Fisher e Ralph Bates, preverteram deliberadamente os factos da controvérsia entre o POUM-CNT e o governo, sobre a reorganização do exército. Os Estalinistas fizeram correr que o POUM-CNT queria manter as milícias frouxamente organizadas em vez de um exército eficientemente centralizado. Isto era uma completa mentira, como se pode demonstrar por milhares de artigos na imprensa de POUM-CNT, quando pedia um exército disciplinado sob comando unificado. O problema real estava nisto: quem dominaria o exército - a burguesia, ou a classe operária? E não era só o POUM-CNT que fazia esta pergunta. No esquema oposto, da Giral, para um exército especial, o orgão da UGT, Claridad, declarava: "Devemos ter todo o cuidado em que as massas e a direcção das forças armadas, que, acima de tudo, têm de ser todo o povo em armas, não nos venham a escapar das mãos" (20 de Agosto de 1936).
Este era o problema real. A burguesia ganhou porque a UGT, o POUM e as CNT-FAI cometeram o desgraçado erro de procurar um exército controlado pelos proletários, dentro de um Estado burguês. A prova de que estavam a favor da centralização e de um comando unificado é que aprovaram os decretos governamentais que, nos meses seguintes, serviram para suprimir o controle proletário do exército. A UGT, o POUM e a CNT, quando deram o seu consentimento a estes decretos, cometeram um crime nada menor, contra a classe operária.
A determinação a favor de um comando unificado sob controle das organizações operárias era falsa porque não fornecia nenhum método para atingir tal objectivo. O pedido que devia ter surgido desde o primeiro dia da guerra seria agrupar todas as milícias e os poucos regimentos existentes numa única força, com eleição democrática das comissões de soldados um em cada unidade, centralizadas numa eleição nacional. Quando novos regimentos fossem mobilizados, as comissões dos seus soldados teriam entrado nos conselhos locais e nacionais. Deste modo, introduzindo as massas armadas na vida política diária, teria sido realmente evitado o controle burguês das forças armadas.
O POUM teve uma admirável oportunidade de demonstrar a eficácia deste método. Na frente de Aragão, durante oito meses, teve o controle directo e organizacional sobre 9.000 milicianos. E teve uma oportunidade única de os educar politicamente e de eleger comissões de soldados, como exemplo para o resto das milícias, e pedir depois um agrupamento em que as suas forças treinadas teriam sido um poderoso fermento. Nada se fez. A imprensa do POUM publicou histórias sobre representantes da frente aragonesa reunidos em congresso. Tais reuniões não passaram de pequenos grupos, porquanto, de facto, o POUM proibiu a eleição de comissões de soldados. Porquê? Entre outras razões pelo facto de ser predominante nas fileiras a oposição aos políticos oportunistas do POUM, e a burocracia temer que a criação das comissões desse lugar a que a Oposição Esquerdista obtivesse uma vitória.
As comissões de soldados era a via única para assegurar o controle proletário do exército. Contudo, só poderia ser um passo transitório. Porque um exército controlado por operários não poderia existir indefinitivamente lado a lado com o Estado burguês. Se o Estado burguês continuasse a existir, destruiria inevitavelmente o controle proletário do exército.
Os proponentes do controle proletário, pertencentes aos POUM-CNT-UGT, jamais apresentaram um programa concreto para deslocar o Estado burguês. Portanto, a sua orientação reduziu à impotência a oposição ao domínio burguês do exército.
5 - Desarmamento dos Operários na Retaguarda
Nos dias da revolução a seguir ao 19 de Julho, os governos de Madrid e da Catalunha tiveram de sancionar o armamento dos operários que já se tinham armado. Organizações proletárias obtiveram licenças de porte de armas para os seus membros. Para os operários, não era só uma questão de se pouparem às tentativas contra-revolucionárias do governo, mas era também a necessidade diária de proteger as comissões de camponeses contra os reaccionários, de proteger contra os bandos fascistas as fábricas, as vias férreas, pontes, costas, descobrir ninhos fascistas escondidos.
Em Outubro veio o primeiro decreto de desarmamento, impondo a entrega de todas as carabinas e metralhadoras ao governo. Na prática, isto foi interpretado como determinação às organizações proletárias para entregarem as licenças de porte de armas aos guardas das indústrias e às comissões rurais. Mas estabeleceu um fatal precedente.
Em 15 de Fevereiro, o governo central ordenou o confisco de todas as armas de grande e pequeno porte que não tivessem licença. Em 12 de Março, o governo ordenou as organizações proletárias que reunissem as armas grandes e pequenas dos seus membros e as entregassem no prazo de quarenta e oito horas. Os Guardas Nacionais Republicanos começaram a desarmar os operários que encontravam nas ruas de Barcelona. Trezentos operários - membros das CNT com licenças de organização - foram assim desarmados pela polícia durante a última semana de Abril.
O pretexto de que as armas eram precisas na frente de batalha era uma descarada mentira, como estava bem à vista de todos os operários; enquanto estes estavam a ser privados de carabinas e revólveres - alguns na posse na CNT desde os dias da monarquia - as cidades estavam a encher-se de forças da polícia reorganizada, armada até aos dentes com as novas carabinas russas, metralhadoras, artilharia e carros de combate.
6 - Métodos Extra-legais de Repressão: A G.P.U Espanhola
Em 17 de Dezembro de 1936, o Pravda, jornal de Estaline, declarava: "Quanto à Catalunha, a purga dos Trotskistas e Anarco-sindicalistas começou; será com a mesma energia com que foi conduzida na U.R.S.S."
Os métodos legais, que eram demasiado vagarosos, foram acrescidos por bandos organizados de terroristas, equipados com prisões privativas e salas de tortura, chamadas "preventórios". Os lacaios recrutados para este trabalho exigem uma descrição: ex-membros da fascista CEDA, gangsters cubanos, chulos de lupanares, forjadores de passaportes, sádicos. Saídas da composição burguesa do Partido Comunista, alimentadas pelo seu programa contra-revolucionário, as quadrilhas organizadas da G.P.U. espanhola tiveram para os operários a ferocidade dos sabujos de Hitler, porque foram treinadas para exterminar a revolução.
Em Abril de 1937, Rodriguez, membro da CNT e Comissário Especial das prisões, encarregou formalmente José Cazorla, membro da Comissão Central Estalinista e Chefe de Polícia sob a Junta de Madrid, e Santiago Carrillo, outro membro daquela Comissão Central, de se apoderarem ilegalmente de operários presos por Cazorla, mas absolvidos pelos tribunais populares, e "levarem os mesmos absolvidos para prisões secretas ou para os batalhões de milícia comunista nas frentes avançadas, onde seriam usados como "fortificações". A CNT em vão pediu rigorosa investigação destas acusações. Só quando se verificou que a quadrilha de Cazorla estava a trabalhar (em extra-programa) com chantagistas que punham em liberdade importantes fascistas, sem sanção oficial, só então Cazorla foi demitido. Mas foi simplesmente substituído por Carrillo, outro Estalinista, e a G.P.U. extra-legal e as prisões privativas continuaram como dantes.
"Está a tornar-se bem claro que as organizações da "Cheka", recentemente descobertas em Madrid, estão directamente ligadas com centros análogos que operam sob uma direcção unificada e com um plano preconcebido de âmbito nacional", Solidaridad Obrera, 25 de Abril de 1937.
Em 8 de Abril , a CNT, armada de provas, forçou finalmente a prisão da quadrilha Estalinista em Múrcia e exigiu a demissão do Governador Civil por manter prisões privativas e salas de tortura. Em 15 de Março, dezasseis membros da CNT tinham sido assassinados pelos Estalinistas em Villanueva de Alcardete, na província de Toledo. O pedido da CNT por um castigo exemplar foi contraditado pela defesa de Mundo Obrero, sob a alegação de que os assassinos eram antifascistas revolucionários. Uma investigação judicial posterior estabeleceu que toda uma quadrilha Estalinista, incluindo os maioriais do Partido Comunista de Villanueva e de Villamayor, operando como "Comissão de Defesa", tinha assassinado inimigos políticos, saqueado, imposto tributos, violado mulheres indefesas daquela área. Cinco dos Estalinistas foram condenados à morte e outros oito a penas de prisão.
O banditismo organizado da G.P.U. espanhola ficou provado pelos próprios tribunais do Governo Espanhol. Mas a imprensa da CNT está cheia de centenas de exemplos em que a contra-revolução "legal" foi auxiliada pela G.P.U. espanhola.
Inédito, 1995
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