Tuesday, February 20, 2007

PETER HAMMILL OU O "FORA DE ÁGUA"


"There's just one thing
none of us should forget:
a political man is just in it for the power
and the smell of success."

Peter Hammill, 1979

É sempre com grande afectividade libertária que espero a saída duma nova obra poético-musical do gerador Hamilliano. de título genérico "Out of Water" é constituído por oito composições de originais que se do ponto de vista musicológico pouco acrescenta à complexidade do universo do discípulo de Van der Graaf do ponto de vista político, social, em suma humano, importantes contribuições são fornecidas para uma melhor compreensão da espécie a que pertencemos e tantas contradições apresenta.
Diria que do ponto de vista literário o mais importante não será salientar essas contradições mas a maneira como elas são descodificadas pelo poeta. Nesse campo Peter Hammill é mestre embora não consagrado, o que não admira, pois da sua parte, nenhuma concessão é feita aos poderes públicos, à indústria, à religião, às instituições.
O problema das relações entre homem e mulher é também abordado sem esquemas pré-estabelecidos o que se verifica na composição Not the Man: "You see I'm not the man I was.../But if I'm not the man/That you took me to be/do I fade from your dreams/disappear from your memory?/Look at me/if I'm not the man I was/than who was he?". Ou ainda a crítica à personagem vulgar de consideração dos problemas que se verifica na composição Evidently Goldfish: "Check the honesty of what's on offer/ True detective of a fake fakir?/All the evidences circunstantial/ As mud the evidence is clear".
A realidade circundante não escapa ao ao olhar penetrante de Hammill e a crítica faz-se logo sentir como por exemplo na composição Hemlock da anterior obra In a Foreign Town de 1988: "Here it comes up on the screen/ the propaganda of the military industrial machine/ By now we find there's little choice/ When our masters tell "smile" we rejoice/ With the nuclear shield safety in place/ We're assured of the survival of the human race". Ainda outro exemplo da composição Sci-Finance: "There goes the daylight/ Night comes on the city so soon/ In the dance of the typical capitalists/ What piper plays the tune?/ No people any more/ Only the money".
Mas o poeta não perde pela demora e os acontecimentos a grande escala que marcam uma época são mencionados interpretativamente como por exemplo Our Oyster que fala sobre a China e os acontecimentos da Praça Tianammen: "This one's authentic/ son of a gun/ a sountrack from China/ in the universal tongue..." e mais à frente: "There's only one language/ The wholw world comprehends/ There's only one message/ as the darkness descends... Do you still have a question/ or do you retact? / There's a whole world of difference/ between the observar and the act./ There're playing world music/ in Tianammen Square/ The whistle of bullets in the air."
Repare-se à chamada de atenção para que os acontecimentos do ano passado que prenderam a atenção da opinião pública devem ser tratados pela via da intersubjectividade já que a ciência contemporânea mostrou que a objectividade pura é uma utopia. O mérito do poeta está em ter pegado no conceito científico e aplicá-lo à realidade social, nesta caso aos acontecimentos recentes na China.
Liricamente falando a composição mais bela nesta obra é a última intitulada A Way Out onde se faz um trocadilho repetitivo com a palavra "out" e onde no fim se fica com a impressão com o fundamental foi dito e que o acessório foi esquecido por ser acessório. Out of Water - "Fora d'Água" é para já a melhor obra musical deste ano e seguramente será das melhores no cômputo geral do ano. Outros aspectos importantes a salientar são os músicos que dão o seu préstimo. Todos eles são conhecidos de longa data, senão vejamos: John Ellis nas guitarras eléctrica, David Jackson nos saxofones e Stuart Gordon no violino. Todos os outros instrumentos ficaram a cargo, como é habitual de Peter Hammill juntamente com a produção, os arranjos e todas as vozes. Julgamos ter razão ao afirmar que Out of Water deve ser a última obra antes de sair a tão esperada ópera "Usher" que por aquilo que sabemos está completamente feita estando na fase dos ensaios. Ópera muito esperada pois está a ser composta desde 1973 e a saída constantemente adiada. O que fica desta crónica é a necessidade de darmos maior atenção a este vulto da música e da poesia (música essa que não foi descortinada) tanto mais que alguém bem informado lhe chamou o "Prometeu Agrilhoado".