Sunday, January 21, 2007

ANTOLOGIA PROUDHONIANA Parte VI

VI REALISMO MORAL E REALISMO SOCIAL1. - MORAL E REALISMO MORALExpliquei na teoria, que tentei apresentar, do progresso, como o progresso tinha o seu princípio na justiça, e como, fora da justiça, qualquer outro desenvolvimento político, económico, literário, filosófico, se tornaria subversivo e dissolvente, e ainda, como o ideal nos fôra dado para nos levar à justiça; mais expliquei como, se este mesmo ideal, em vez de servir de auxiliar e de instrumento de direito, fosse, ele próprio, tomado como, regra e objectivo da vida, haveria imediatamente, para a sociedade, decadência e morte. Numa palavra: à justiça, subordinei o ideal. (Porncratie, cap. V.)A moral é o conjunto das normas que têm como objectivo a perseverança na justiça. É, noutros termos, o sistema da justificação, a arte de o homem se tornar santo e puro pelas obras, ou seja, ainda e sempre: o progresso ... (Philos. du Progrès, 1.º estudo.)Não são os homons que governam as sociedades, mas os princípios; na falta de princípios, são as situações.A França perdeu os seus costumes.Pelo cepticismo, o atractivo puramente moral do casamento, da geração, da família, o atractivo do trabalho e da cidade, uma vez perdidos, dá-se a dissolução do ser social... Ciência e consciência da justiça... eis o que nos falta.A. Ciência e consciência da justiçaPara formar uma família, para que o homem e a mulher nela encontrem a alegria e a calma a que aspiram, sem as quals, aproximados apenas pelo desejo, eles nunca estarão sempre incompletamente unidos, é precisa uma fé conjugal, entendendo eu por isso uma ideia da sua dignidade mútua...Do mesmo modo para formar uma sociedade, para dar aos interesses das pessoas e das famílias a segurança - que é a sua primeira necessidade, sem a qual o trabalho não se aceita, a troca dos produtos e dos valores se torna uma burla, a riqueza uma cilada para quem a possui - é preciso aquilo a que eu chamaria uma fé jurídica...Do mesmo modo ainda, para formar um Estado, para conferir ao poder adesão e estabilidade, é precisa uma fé política, sem a qual os cidadãos, entregues às puras atracções do individualismo, não saberiam, seja o que for que fizessem, ser outra coisa que não fosse um agregado de exigências incoerentes repulsivas... É pois preciso que a Justiça, nome pelo qual designamos esta parte da moral que caracteriza o indivíduo em sociedade, para se tornar eficaz, seja mais que uma ideia, é preciso que seja ao mesmo tempo uma realidade. É preciso que ela aja, não só como noção da razão, relação económica, fórmula de ordem, mas ainda como força da alma, forma da vontade, energia interior, instinto social, análogo para o homem àquele instinto comunista que observámos nas abelhas. Há razões para se pensar que, se a Justiça permaneceu até hoje impotente, é porque, como faculdade, força motriz, a menosprezámos completamente, porque desprezámos a sua cultura, porque ela não caminhou, no seu desenvolvimento, ao passo da inteligência; enfim, porque a tomámos por uma fantasia da nossa imaginação ou impressão misteriosa duma vontade estranha. É preciso pois que ela nos apareça finalmente como o princípio, o meio e o fim, a explicação e a sanção do nosso destino. (Justice, Philos. Popul.)Para explicar a razão da história e salvar a oral... era, pois, forçoso demonstrar que a justiça algo mais que um comando e uma relação; que é nda uma faculdade positiva da alma, uma força da mesma ordem que o amor, superior mesmo ao amor, enfim uma realidade: e foi o que nós tentámos nestes Estudos... (Justice, L'Êtat.)B. A moral, realidade socialImanêneia e realidade da justiça na humanidade, tal é o grande ensinamento... A moral... expressão da liberdade e da dignidade humana, existe por si própria; ela não depende de nenhum princípio; domina toda a doutrina, toda a teoria...É no comando da vossa consciência que deveis procurar a garantia das vossas ideias e até a prova da vossa certeza...A justiça é em vós ao mesmo tempo realidade e pensamento soberano... (La Guerre et la Paix, concl. geral.)A moral - e a sua correlativa, a estética - é coisa sui generis: nao é um produto do pensamento puro ou da razão, como a teologia... É uma revelação que a sociedade, o colectivo, faz ao homem, ao individuo. - Torna-se impossível deduzir a moral, quer da higiene, quer da economia, quer da metafísiea ou teodiceia, como o fizeram, sucessivamente, os materialistas, os utilitaristas, os cristãos dogmátieos, tais como Bossuet, etc. A moral resulta doutra coisa. Esta outra coisa, a que uns chamam consciência, outros razão prática, etc., é, para mim, a essência social, o ser colectivo que nos contém e que nos penetra e que, pela sua influência, pelas suas reve,lações, completa a constituição da nossa alma...Não cometam essa grande imoralidade de fazer da moral uma coisa noológica. Seriam forçados, mais tarde ou mais cedo, a reconhecer que essa pretensa moral não tem, nem principio, nem valor, nem objectivo, nem função. (Lettre à Cournot, 31 de Outubro de 1853.)C. Estética e moral socialAquilo que a moral revela à consciência sob a forma de normas, a estética, tem por objectivo mostrá-la aos sentidos sob a forma de imagens... São dois aspectos da nossa educação, ao mesmo tempo sensíveis e intelectuais, que se tocam na consciência e que só diferem no órgão ou na faculdade que lhes serve de veículo. Aperfeiçoar-se pela justiça... desenvolvendo-a na sua verdade íntegra, tal é o objectivo indicado ao homem pela moral. Aperfeiçoar-se pela Arte, depurando incessantemente, à semelhança da nossa alma, as formas que nos rodeiam, tal é o objectivo da estética. (Philos. du Prog., 2e lettre.)O que é a arte e qual é o seu destino social?Uma representação idealista da natureza e de nos proprios, com fim ao aperfeiçoamento fisico e moral da nossa espécie... (Du Principe de l'Art, cap. XII.)O objectivo da Arte é ensinar-nos a juntar o agradável ao útil, em todas as coisas da nossa existência, e, através disso, contribuir para a nossa dignidade. (Du Principe de l'Art, cap. XXIII.)A Arte, isto é, a procura do belo, a perfeição do verdadeiro no homem, na mulher e nos filhos; nas ideias, discursos, acções; nos produtos: tal é a última evolução do trabalhador... A estética e, acima da estética, a moral: eis a pedra angular do edifício económico. (Contr. Écon., cap. XIII.)A Arte, como a literatura, é a expressão da sociedade, e quando não existe para o seu aperfeiçoamento, existe para a sua ruina. (Pr. Art., cap. X.) A Arte deve participar no movimento da sociedade, provocá-lo e segui-lo. Foi por ter menosprezado este destino da Arte, por o ter reduzido somente à expressão duma idealidade quimérica, que a Grécia perdeu a compensação das coisas e o ceptro das ideias. (Philos. du Prog., 2e lettre.)É possível uma estética, uma teoria da arte? - A Arte é a própria liberdade, restabelecendo à sua vontade, e em virtude da sua própria glória, a fenomenalidade das coisas, executando variações s;obre o tema concreto da natureza.- A Arte, assim como a liberdade, tem pois como matéria o homem e as coisas; como objectivo, reproduzi-los ultrapassando-os; como fim último, a justiça. Para decidir da beleza das coisas - noutros termos: para as idealizar - é preciso conhecer as relações entre as coisas... o ideal é dado pelo real; ele tem a sua base, a sua causa, a sua força de desenvolvimento, no real.- A Arte é solidária com a ciência e a justiça: eleva-se com elas e declina ao mesmo tempo que elas. (Justice, Prog. et Décadence.)D. Sanção moral e solidariedade socialEm virtude da solidariedade moral que une os homens, é raro que um acto de prevaricação seja completamente isolado e que o prevaricador não tenha por cúmplice, directo ou indirecto, a sociedade e as suas instituições. Somos todos, uns mais outros menos, culpados uns para com os outros, e o que diz Job não é verdadeiro: pecador perante Deus, estou inocente perante os homens. Nesta comunidade de consciência, sendo a Justiça reciproca, é-o também a sanção; a reparação deve comportar-se do mesmo modo. Quais são as causas, os pretextos, se tal quisermos, que arrastaram o acusado? Que injustiça, que tolerância, que favor o provocou? Que mau exemplo lhe foi dado? Que omissão, que contradição do legislador atormentou a sua alma? De que ofensas, - seja da parte da sociedade, seja da parte dos particulares - se lamenta ele? Quais as vantagens, dependentes da vontade pública, de que não goza?... Eis o que o juiz de instrução deve investigar, com tanto cuidado como as próprias circunstâncias do crime ou delito... (Justice, Sanction morale.)2. - REALISMO SOCIAL E AGENTES DA MORALTendo sido apresentado o homem, a família, a sociedade, um ser colectivo, sexual e individual dotado de razão, de consciência e de amor, cujo destino é instruir-se através da experiência, aperfeiçoar-se pela reflexão e criar a sua subsistência pelo trabalho:Organizar as forças deste ser... tal é o problema. (Idée Gén. de la Révol., 7.º estudo.)Quando se tiver visto como, na espécie humana, o indivíduo e a sociedade, indivisivelmente unidos, formam no entanto dois seres distintos, ambos pensantes, actuantes e progressivos, e como o primeiro recebe uma parte das suas ideias do segundo e exerce, por sua vez, uma influência sobre ele; quando dermos conta deste dualismo... que compõe a existência colectiva e as existências individuais... teremos a ciência progressiva... terminando toda a teosofia na moral. (Phil. du Prog, 2e lettre.)A. O homem antagonistaa) A sua natureza compósitaA unidade de todo o ser é uma unidade de composição... O ser... é um grupo...Do mesmo modo que na lógica a ideia de... progresso se traduz na série; do mesmo modo, na antologia, ela tem como sinónimo o grupo. Quanto mais numerosos e variados forem os elementos e as relações que concorrem para a formação do grupo, mais força nele se encontra, mais realidade obtem o ser... O homem vivente é um grupo. (Philos. du Progrès, 1e lettre.) O homem, ser organizado, é um composto de força. (La Guerre et la Paix, liv. II, cap. VII.)Há, na humanidade, o ser fatal e o ser progressivo, inseparáveis, mas distintos; opostos, antagonistas, mas para sempre irredutlveis. Na qualidade de criaturas dotadas duma espontaneidade irreflectida e involuntári.a, submetidas às leis dum organismo físico e social, regulado para toda a eternidade, imutável nos seus termos, irresistivel no seu conjunto, e que se completa e se realiza por desenvolvimento e crescimento; enquanto vivemos, crescemos e morremos, trabalhamos, trocamos, amamos, etc., somos o ser fatal, in quo vivimus, movemur et sumus. Somos a sua subsistência, a sua alma, o seu corpo, o seu rosto, na mesma qualidade e nem mais nem menos que os animais, as plantas e as pedras.Enquanto observamos, reflectimos, aprendemos e agimos em consequência, que submetemos a nós a natureza e nos tornamos senhores de nós próprios, somos o ser progressivo, somos homens. (Contr. Écon., cap. XI.)Há o homem ele-próprio; isto é, a vontade e a consciência, o livre arbítrio e a lei, opostos num antagonismo perpétuo. O homem está em guerra om ele próprio. (Prem. Mémoire, cap. I.)Não menosprezo, nem o facto do antagonismo... assim como a necessidade de reconciliar o homem com ele próprio; toda a minha filosofia não é mais que uma perpetuidade de reconciliações. Reconheçam que a divergência da nossa natureza é o preliminar da sociedade, ou melhor: o material da civilização. Pois aqui têm justamente esse caso - mas, notem-no bem, o caso indestrutlvel, a que procuro o sentido. Estaríamos certamente muito perto de nos entendermos, se vós, em vez de considerardes a dissidência e a harmonia das faculdades humanas como dois períodos distintos, definidos e consecutivos na história, consentisseis comigo em ver nestes unicamente as duas faces da nossa natureza, sempre adversas, sempre em obra de reconciliação, mas nunca totalmente reconciliadas. Numa palavra: tal como o individualismo é o facto primordial da humanidade, a associação é o termo complementar desta; mas ambos estão em manifestação incessante, tal como sobre a terra a justiça é eternamente a condição do amor...O homem, agregado do universo, resume e sincretiza na sua pessoa todas as virtualidades do ser, todas as cisões do absoluto; ele é o vértice onde estas virtualidades, que só existem pela sua divergência, se reúnem em feixe, mas sem se penetrarem nem se confundirem. O homem é pois ao mesmo tempo, devido a esta agregação, espírito e matéria, espontaneidade e reflexão, mecanismo e vida, anjo e besta...O homem é tirano ou escravo pela vontade, antes de o ser pela fortuna... (Contr. Écon., cap. VIII.)b) As suas duas necessidadesResponsabilidade e equivalência: O homem não tem nada mais precioso que ele próprio e, por conseguinte, nenhuma outra lei que não seja a sua responsabilidade.O homem não sai da sua preguiça, a não ser quando a necessidade o aperta; o meio mais seguro de nele aniquilar o gênio, é libertá-lo de preocupações, retirar-lhe o atractivo do lucro e da distinção social resultante, criando em redor dele a paz, e por toda a parte, a paz, e transportando para o Estado a responsabilidade da sua inércia.Sim, é preciso dizê-lo, não obstante o quietismo moderno: a vida do homem é uma guerra permanente, guerra com a necessidade, guerra com a natureza, guerra com os seus semelhantes - consequentemente, guerra com ele próprio.A teoria duma igualdade pacífica, baseada na fraternidade e na abnegação, não é maís que uma imitação da doutrina católica da renúncia aos bens e aos prazeres deste mundo, o princípio da indigência, o elogio da miséria. O homem pode amar o seu semelhante até morrer; não o ama até trabalhar para ele... (Contr. Écon., cap. V.)A própria igualdade só existe através da equivalência.É-se pobre... não tanto pela privação do que falta a toda a gente, mas pelo desejo de bens conhecidos, apreciados, e que o desenvolvimento da inteligêneia, a excitação da sensibilidade, ou qualquer outra causa, tornaram necessários. Este desejo nasce ,sobretudo da comparação das fortunas: eis a razão por que o servo feudal, menos pobre que o escravo romano ou grego, não era, apesar disso, mais feliz; tal como o proletário francês, menos pobre que o proletário romano, não é mais feliz... Donde vêm todos estes infortúnios? Nem mais nem menos, que da distinção das classes, da desigualdade. A sociedade, no seu conjunto, pode ganhar em moral, em inteligências, mesmo em riqueza; mas, enquanto essa sociedade contiver extremos, a distância entre o pobre e o rico, entre o servo e o barão, permanece a mesma, não há felicidade pública. (Avertiss. aux Propr.)O pauperismo é a pobreza anormal, actuando de modo subversivo; qualquer que seja o facto particular a seguir ao qual ele se produz, ele consiste na falta de equilíbrio entre o produto do homem e o seu rendimento, entre a sua despesa e a, sua necessidade, entre o sonho da sua ambição e a força das suas faculdades - consequentemente, nas condições dos cidadãos. (La Guerre et la Paix, liv. IV, cap. III.)c) A ironia libertadoraO que falta à nossa geração não é, nem um Merabeau, nem um Robespierre, nem um Bonaparte: é um Voltaire. Não sabemos apreciar nada com um olhar da razão, independente e trocista. Escravos das nossas opiniões como dos nossos interesses, à força de nos tomarmos a sério, tornamo-nos estúpidos. A ciência, cujo fruto mais precioso é acrescentar incessantemente a liberdade de pensamento, transforma-se, em nós, em pedantismo; em vez de emancipar a inteligência, embrutece-a. Totalmente obstinados pelos nossos amores e pelos nossos ódios, não rimos dos outros mais do que de nós: perdendo o nosso espírito, perdemos a nossa liberdade... (Confes. dun Révol., cap. XXI.)B. O casala) O casal, órgão da justiçaO homem e a mulher formam, na moral como no físico, um todo orgânico, eujas partes são complementares uma da outra; é uma pessoa composta por duas pessoas... E este organismo tem por objectivo criar a justiça estimulando a consciência, e tornar possível o aperfeiçoamento da humanidade r si mesma, isto é, a civilização...P. - O que é o casal conjugal?R. - Toda a força da natureza, toda a faculdade da vida, toda a afeição da alma, toda a categoria de inteligência tem necessidade, para se manifestar e agir, dum órgão. O sentimento da justiça não podia constituir excepção a esta lei. Mas a justiça, que rege todas as outras faculdades e ultrapassa a própria liberdade, não podendo ter o seu órgão no indivíduo, tornar-se-ia para o homem uma noção sem eficácia, e a sociedade seria impossível, se a natureza não tivesse recorrido ao organismo jurídico, fazendo de cada indivíduo como que a metade dum ser superior, cuja dualidade andrógina se torna, para a justiça, um órgão. (Justice, Amour et Mariage.)Ser composto por duas pessoas... este casal é o verdadeiro sujeito humano. (Pornocratie, cap. III)P. - Por que é que o indivíduo é incapaz de servir de órgão à justiça?R. - Porque ele só possui como fundamento seu o sentimento da sua própria dignidade, o qual é adequado ao livre arbítrio, enquanto que a justiça é necessariamente dual, supondo, por conseguinte, pelo menos duas consciências em uníssono: de modo que a dignidade do sujeito aparece unicamente como primeiro terino da justiça e só se torna respeitável para ele enquanto interessar a dignidade dos outros. É pelo casamento que o homem aprende, pela própria natureza, a sentir-se duplo: a sua educação social e a sua elevação na justiça não serão mais do que o desenvolvimento deste dualismo...O órgão de justiça é o casal, considerado como dualidade pessoal, formando pelo contraste entre os atribuitos um ser complexo, o embrião social.A família, extensão do casal conjugal, não faz senão desenvolver o órgão de jurisdição; a cidade, formada pelo cruzamento das famílias, reprodu-lo, por sua vez, com uma força superior; o destino social é solidário com o destino matrimonial, e cada um de nós, por esta comunhão universal, vive do mesmo modo que a espécie humana.... O casal conjugal, a família, a cidade, formam assim três graus de jurisdição.P. - Por que razão, no oraganismo jurídico, as duas pessoas são dissemelhantes?R. - Porque, se fossem semelhantes, não se completariam uma à outra; seriam dois todos independentes, sem acção recíproca, incapazes, por esta razão, de produzirem Justiça. (Justice, Amour et Mariage.)A justiça tem como condição orgânica um duamo. Este dualismo consiste no casamento, formado a união de duas pessoas complementares uma da outra, e cuja essência é a dedicação, esse preparador do amor... Deste modo se conclui esta aparente contradição que diz ao homem: mandar para melhor servir; à mulher: obedecer para melhor reinar, contradição que exprime, com vigor, a engrenagem trimonial... a lei e o mistério...Face a uma prepotência masculina, constato proeminência feminina. (Pornocratie, cap. III.)P. - O que é o amor?R. - O amor é o atractivo que experimentam, invencivelmente, uma pela outra, a Força e a Beleza. (Justice, Amour et Mariage.) (Não se esqueça que falo, da beleza como da força, sob todos os pontos de vista fisico, intelectual e moral.) (Pornocratie, cap. I.)A sua natureza, no homem e na mulher, não é, por conseguinte, a mesma. Todavia, é através do amor que a sua consciência se abre em ambos à justie,a, tornando-se cada um para o outro, ao mesmo tempo, uma testemunha, um juiz e um segundo ele próprio...Que cada homem ame todas as mulheres na sua esposa, e que cada mulher ame todos os homens no seu marido. É assim que ambos conhecerão o verdadeiro amor, e que a fidelidade lhes será agradável. Porque, o amor, na essência universal, tende a realizar-se na universalidade; se o homem e a mulher que casam parecem sair da indivisão, isto apenas acontece quanto à coabitação e aos deveres que ela impoe; para o resto, isto é, para o ideal, eles permanecem na comunidade. O casamento que os une ;.não é uma apropriação mútua dos seus corpos e das suas almas... é a representação do amor infinito, que vive no fundo dos seus corações. É por isso que o homem que falha com a sua mulher falha com todas as mulheres, e a mulher que falha com o seu marido é com justa razão menosprezada por todos os homens. (Justice, Amour et Mariage.)b) A relação entre os sexosO sistema de relações entre o homem e a mulher, que procurei estabelecer, com base na quivalêneia dos seus atributos, deverá, pelo contrário, fundamentar-se na igualdade e na identidade desses mesmos atributos? Toda a discussão está ai...O homem e a mulher podem ser equivalentes... Não são, de maneira nenhuma, iguais. Fora da sexualidade orgânica, existe uma diferença, que toda a gente sente, e que a razão proclama irredutível, entre o homem e a mulher...A inteligência, na mulher, distingue-se, como o corpo, através de qualidades especiais, servindo de complemento e de contrapeso à do homem. Se o homem, expressão da força, está para a mulher como 27 estão para 8, a mulher, expressão do ideal, está para o homem como 27 estão para 8...Resumo toda esta análise em duas palavras: O homem é principalmente uma força de acção; a mulher, uma força de fascinação. Da diversidade da sua natureza deriva a diversidade das suas qualidades, das suas funções, dos seus destinos. (Pornocratie, cap. II.)Para mim, quanto mais penso nisso, menos posso justificar a mim mesmo, fora da família e da vida caseira, o destino da mulher... Em que é que o papel da mulher, encarregada do governo da casa, de tudo o que se relaciona com o consumo e a poupança, é inferior ao do homem, euja função própria é o comando da fábrica, isto é, o governo da produção e da troca?...O homem e a mulher estão, um para o outro, como os dois princípios constitutivos do trabalho: o casamento, na sua dualidade indissolúvel, é a inearnação do dualismo económico, que se exprime, como se sabe, através dos termos gerais de consumo e produção. Foi com esta intenção que foram estabeleeidas as aptidões dos sexos. (Contr. Écon., cap. XI.)Por isso mesmo é que uma mulher... sai do seu sexo, quer igualar-se ao homem... acontece... que ela está dominada por um pensamento fixo que, a partir desse momento, não a abandona mais, que faz as vezes de gênio e das ideias.Este pensamento consiste em que em todas as coisas, razão, virtude, talento, a mulher vale tanto como o homem, e em que, se ela não ocupa o mesmo lugar na sociedade, há violência e iniquidade a seu respeito... (Justice, Amour et Mariage.)A mulher que se afasta do seu sexo, não só e as graças que a natureza lhe deu, sem adquirir nossas, como cai na condição de fêmea...O nivelamento dos sexos conduz à decadência geral sem vida caseira e família, não há justiça, não há sociedade. (Pornocratie, notas e pensamentos.)c) A família., base da sociedadeEntre o amor e a justiça - noutros termos: entre o casamento e a sociedade, ou o Estado existe uma relação intima, um laço de solidariedade, reconhecido em todos os tempos, em virtude do qual todo o atentado à justiça e à liberdade pública é destrutivo da família e, por conseguinte, do próprio amor; reciprocamente, todo o atentado ao amor e ao casamento é destrutivo da sociedade e do Estado. O casamento, órgão natural e formador da justiça, é a base da sociedade.As liberdades públicas têm por base e por salvaguarda os costumes domésticos. As mesmas máximas pelas quais se destroem os direitos dos povos são aquelas pelas quais... derrubais a ordem das famílias. (Pornocratie, introd.)Não vejo senão a família para poder interessar-nos, ao mesmo tempo de espírito e de coração, penetrar-nos de amor, de respeito, de recolhimento, dar-nos a dignidade, a calma piedosa, o profundo sentimento moral, que sentia outrora o cristão ao sair da comunhão...Encontro... em todo este conjunto qualquer coisa de misterioso, de divino, que em nada contradiz a razão, mas que no entanto a ultrapassa sempre. (Pornocratie, notas e pensamentos.)C. Os seres colectivosAs colectividades são entidades tão reais como as individualidades que as constituem... O homem e a mulher formam, pela sua união, um organismo... muito real; passa-se o mesmo em relação à família, à cidade, à nação.Para mim, a sociedade humana é um ser real tal como o homem que dela faz parte. Este ser formado por homens, mas que não é a mesma coisa que o homem, tem a sua vida, a sua força, os seus atributos, a sua razão, a sua consciência, as suas paixões. Tem pois também as suas leis próprias... leis e relações que a observação nos revela e que não daria o único conhecimento orgânico e psicológico do indivíduo. (Pornocratie, cap. V.)a) Realidade do ser colectivoA condição de toda a existência, depois do movimento, é, indubitavelmente, a unidade; mas, de que natureza é esta unidade? Se interrogarmos a teoria do progresso, ela responde-nos que a unidade de todo o ser é essencialmente sintética, que é uma unidade de composição... É de acordo com esta concepção do ser em geral, e em particular do eu humano, que julgo possível provar a realidade positiva, e até certo ponto demonstrar as ideias (as leis) do eu social ou do grupo humanitário, e constatar e manifestar, acima e para fora da nossa existência individual, a existência duma individualidade superior do homem colectivo...- Quanto a mim, de acordo com a noção de movimento, progresso, série, grupo, que a ontologia é forçada, doravante, a ter em consideração, e segundo as informações que a economia e a história, fornecem sobre a questão, vejo a sociedade, o grupo humano, como um ser sui generis, constituído pela ligação fluídica e pela solidariedade económica de todos os indivíduos quer da nação, quer da localidade ou corporacão, quer da espécie inteira... Um ser que tem as suas próprias funções, estranhas à nossa individualidade, as suas ideias, que nos comunica, os seus juízos, aue não se parecem em nada com os nossos... (Philos. du Prog., 1e lettre.)b) A força colectivaOs indivíduos não são os únicos dotados de força; as colectividades têm também a sua.Uma fábrica, formada por operários cujos trabalhos convergem para um mesmo fim, que é obter este ou aquele produto, possui enquanto fábrica ou colectividade, uma força que lhe é própria: a prova está em que o produto desses indivíduos, assim agrupados, é muito superior ao que constituiria a soma dos seus produtos particulares, se tivessem trabalhado separadamente...Do mesmo modo, a tripulação dum navio, uma sociedade em comandita, uma academia, uma orquestra, um exército, etc., todas estas colectividades contêm força, força sintética e, consequentemente, específica do grupo, superior em qualidade e em energia à soma das forças elementares suas componentes...Consequentemente, sendo a força colectiva um facto tão positivo como a força individual, a primeira perfeitamente distinta da segunda, os seres colectivos são realidades do mesmo modo que os indivíduos...Pelo seu poder, que é de todos os seus atributos o primeiro e o mais substancial, o ser social apresenta-se pois na qualidade de realidade e de vida; apresenta-se, entra na criação, da mesma maneira sob as mesmas condições de existência que os s seres... (Justice, L'État.)No que diz respeito à substancialidade e à organização do ser social, demonstrei a primeira como o acréscimo de força efectiva próprio do grupo, e que excede a soma das forças individuais componentes; apresentei a lei da segunda, fazendo ver que ela se reduz a uma ponderação das forças, dos serviços e dos produtos, o que faz do sistema social uma equação geral, uma balança.Enquanto organismo, a sociedade, o ser moral por excelência, difere essencialmente dos seres vivos, nos quais, a subordinação dos órgãos é a própria lei da existência... (Justice, Les Idées.)c) A razão colectivaTrata-se de dar a este ser colectivo, de que demonstrámos a força e a realidade, uma inteligência; é isso que conseguiremos, por uma última eliminação do absoluto, cujo efeito será criar a Razão pública, guardiã de toda a verdade e de toda a justiça, centro e apoio de qualquer razão particular, e sem a qual a Fé pública, é impossível...Na qualidade de absoluto livre, o homem tende a subordinar tudo o que o rodeia, coisas e pessoas, os seres e as suas leis, a verdade teórica e a verdade empírica, o pensamento como à inércia, a consciência e o amor como a estupidez e o egoísmo.Dai o carácter da razão individual, na qual o absoluto - conforme a própria lei da individualidade - tende a ocupar um lugar cada vez maior, diferentemente da razão colectiva, na qual o absoluto tende a ocupar um lugar cada vez menor. É efectivamente na razão colectiva que as relações, sustentadas umas pelas outras... são, ao mesmo tempo, a lei e a realidade social ...Diante do homem, seu semelhante, absoluto como ele, o absolutismo do homem pára de repente; ou melhor, estes dois absolutos destroem-se mutuamente, só deixando subsistir, das suas respectivas razões, a relação entre as coisas, a respeito das quais eles lutam...Creio ser inútil insistir nesta distinção fundamental entre a razão individual e a razão colectiva, a primeira essencialmente absolutista, a segunda antipática a todo o absolutismo...A teoria da razão colectiva asseiita neste facto, de observação noológica, que nenhuma explicação seria capaz de destruir:Quando dois ou vários homens são chamados a pronunciarem-se contraditoriamente sobre uma questão, seja de ordem natural, seja, e por maioria de razão, de ordem humana, resulta da eliminação que são conduzidos a fazer, reciprocamente e respectivamente, da sua subjeetividade - ou seja, do absoluto que o eu afirma e representa -uma maneira de ver comum, que já não se parece, de modo nenhum, nem no fundamento nem na forma, com o que teria sido, sem esse debate, a sua maneira de pensar individual...Esta maneira de ver, na qual só entram relações puras, sem mistura do elemento metafísico e absolutista, constitui a razão colectiva, ou razão pública.Concordemos então que a razão colectiva não é uma palavra vã: ela é, indubitavelmente, antes de tudo, uma relação. Ora, como a relação ou a razão das coisas é em tudo o facto capital, a mais elevada realidade, eu digo que a razão colectiva resulta do antagonismo entre as razões particulares, tal como a força pública resulta do concurso das forças individuais, é uma realidade do mesmo modo que esta forca; e uma vez que elas se reúnem na mesma colectividade, concluo daí que forinam os dois atributos essenciais do mesmo ser, a razão e a forca... O órgão da razão colectiva é o mesmo que o da força colectiva: é o grupo trabalhador, instrutor; é a companhia, industrial, sábia, artista; são as academias, escolas, municipalidades; é a assembléia nacional, o clube, o júri; é toda a reunião de homens; é, numa palavra, formada para a discussão das ideias e para a procura do direito... (Justice, Les Idées.)d) A pluralidade dos seres colectivosAs colectividades particularesTodo o grupo humano, família, oficina,... pode considerado como embrião social. (Justice, L’État.)No seio da universalidade social, exístem sociedades particulares... Devemos cumprir os deveres que elas nos impõem, segundo a ordem de proximidade com que se formaram à nossa volta.Esta teoria de sociedades particulares... no seio da grande sociedade, resolve todo sos problemas que as diferentes espécies de deveres sociais possam levantar, em virtude das suas oposições e dos seus conflitos.(Prem. Mém., cap. V.)As colectividades geraisA sociedade económica:A unidade, constitutiva da sociedade é a oficina... A oficina implica uma pessoa colectiva... m seguida as relações das oficinas entre si. (Contr. Écon., cap. V.) A sociedade é um ser real... e por isso a existência de todo um mundo de ligações. (Pornocratie.) Para o verdadeiro economista, a sociedade é um ser vivo... cuja existência se manifesta... pelo pacto da intima solidariedade entre todos os membros (Contr. Êcon., cap. II.) Na sociedade tra. há um trabalhador diversificado ao infinito.(Carnets, 11 de Março de 1846.)O Estado:O Estado é uma realidade tão positiva como a a sociedade, como o indivíduo... Não lhes é em anterior nem superior... É uma pessoa como o são as famílias, as sociedades... as corporacões, w comunas. (Th. de l’impôt, cap. II.) Em geral, não é dos grupos, tais como os acabámos de conceber, .que nasce a cidade, o Estado. Os grupos activos que compõem a cidade diferem... a ligação, que os une já não é tanto uma ligação de cooperação como uma ligação de comutação... O Estado resulta da reunião de vários grupos diferentes... congregados sob uma lei comum e num interesse idêntico... Entende-se por limite do poder a determinação atributiva dos grupos e subgrupos de que ele é a expressão geral. (Justice, I'État.)A Nação:Pelo agrupamento das forças individuais e pela ligação entre os grupos, a nação inteira forma corpo, é um ser real. (Justice, L'Êtat.)Uma nação é algo de diferente duma colecção de indivíduos, é um Ser sui generis, uma Pessoa viva...O que procuro pois, compreende-o agora, Senhor, é a demonstração deste grande ser, são as leis da sua vida, as formas da sua razão, é, numa palavra, a sua psicologia...Eu, o homem menos místico que existe no mundo, o mais realista, o mais afastado de toda a fantasia e de todo o entusiasmo, creio estar já em condições de afirmar - e prová-lo-ei - que uma nação organizada como a nossa constitui um ser tão real, tão dotado de vontade e de inteligência própria como os indivíduos que a compõem; e ouso dizer que está ai, sobretudo, a grande revelação do século XIX. A História da Revolução, feita sob este ponto de vista, é a melhor preparação que eu poderia desejar para os meus leitores. Depois de terem visto, na narração, pensar, agir, sofrer, combater o ser colectivo, ficarão com melhor disposição para compreender as leis da sua formação, do seu desenvolvimento, da sua vida, do seu pensamento, e da sua acção... (Lettre à Michelet, 11 de Abril de 1851.)Eu sei de que maneira pensaram representar a permanência do progresso na humanidade (a sua incorruptibilidade) ao mesmo tempo que defendiam a degenereseência das nações; imaginaram o progresso, ou a virtualidade social, como um fluido que percorre cada raça de sua vez, indo de Oriente a Ocidente, ao contrário do sol; dos Indianos aos Bactrianos, dos Bactrianos aos Assírios, destes aos Gregos, dos Gregos aos Romanos, depois aos Celtas, e finalmente as Americanos. Nodier exclamava no fim da sua vida: a América já está velha, para a China...É fácil notar certos factos históricos, que nos aparecem como decadências ou corrupções de sociedades particulares... basta lembrar, como mais conhecidos, os da Grécia, de Roma, da França... A virtualidade na nação não é a soma das virtualidades individuais; antes, é de natureza diferente, e pode existir à parte; sem dúvida que estas devem harmonizar-se; mas, podem também combater-se. Se alguma coisa for susceptível de constituir obstáculo, quer a uma quer a outra, será quando, por efeito do preconceito que constitui a essência da velha democracia, a soma das individualidades, supondo-se soberana, usurpar o lugar da sociedade, usurparão funesta, e que é expressa nesta frase pública: levantar-se como um homem...A causa primeira, orgânica, perseverante, da destruição da sociedade romana foi o hábito adquirido desde o começo da república, da suspensão da vida social, por aquilo que se chamava: a Roma dictator... Em Roma, como no Oriente, como na Rússia, o povo gostava sobretudo destas individualizações da acção colectiva, que permitem realizar maravilhas e que, para o vulgo, manifestam melhor a força pública que as instituições e as estatísticas. O Triunfo, tão querido para os Romanos, era verdadeiramente a imolação da sociedade pela exaltarão do sentimento individual generalizado em detrimento da virtualidade puramente social. Era bem preciso que um dia o triunfador se fixasse permanentemente; que o ditador se tornasse absoluto; então, seria o fim da sociedade romana. O povo, como os Jacobinos e comunistas dos nossos dias, não concebia nada de mais belo que esta unidade: unidade morganática e que é sinónimo de morte social!...P, o que acontece quando o povo, tomando a acção em massa como acção social; a uniformidade disciplinar por unidade orgânica; o prestígio monárquico, ditatorial, triunfal, a riqueza, a grandeza e a glória, acaba por atribuir-se depositário do seu pensamento e do seu poder, por destruir o seu próprio organismo e por se reduzir, segundo a expressão de Napoleão, ao estado de poeira!...Este destino da democracia foi o de todos os povos da antiguidade: a coisa era inevitável...Hoje, uma semelhante solução já não é possível; a condição das nações civilizadas já não permite, nem a exploração das raças vencidas, em proveito duma só, nem o regresso à antiga escravatura... A experiência do governo directo das massas destruiu o erro grosseiro que levava a tomar a generalidade duma opinião por uma ideia social, e a acção em globo pela acção da sociedade. Ainda que todos oc, franceses o quisessem, a ditadura é incompatível com a sua situação económica...É verdade que, sendo a época presente aquela em que, pela primeira vez, a civilização começa a ter consciência dessa lei, a inquietação apodera-se de todas as classes, e seria necessário um esforço supremo para fazer voltar os povos atrás. Loucura de intriguistas, de militares fanfarrões e de hipócritas... O organismo económico mata o despotismo militar e sacerdotal... (Lettre à M. X...., 27 de Set. de 1853.)A humanidade internacionalQue, de Nação em Nação, os trabalhadores se auxiliem mutuamente! (Contr. Écon., cap. X, 1846.) Exortem... a liberdade, a igualdade, a filosofia, a revolução económica... Preparem-se para uma revolução mais radical que fará desaparecer... todas essas distinções de nacionalidade. (Lettre à Herzen, 24 de Abril de 1861.)Uma naçõo, um Estado, é uma pessoa colectiva, dotada, como o indivíduo, duma vida própria, que tem a sua liberdade, o seu carácter, o seu gênio, a sua consciência, e, consequentemente, os seus direitos - sendo o primeiro destes a manutenção da sua independência e da sua autonomia. Mas... todos estes direitos devem desaparecer perante a necessidade que, multiplicando os homens, desenvolvendo as populações e os Estados, os força a juntarem-se, a penetrarem-se mutuamente, a fundirem-se.No ponto de condensação que atingiram, o agrupamento por grandes inasses, reside, até nova ordem, a lei dos povos da Europa. A sua segurança comum, os interesses do seu comércio e da sua indústria, do seu desenvolvimento intelectual e moral fazem destas grandes associações uma necessidade. (La Guerre et la Paix, liv. II, cap. VII.)As nacionalidades devem ir-se apagando cada vez mais pela organização económica, descentralização dos Estados, cruzamento das raças e permeabilidade dos continentes. (La Guerre et la Paix, concl. geral.)A fusão das classes, como o cruzamento das raças, é uma condição do progresso. A humanidade não é bela, não tem aspecto nem força a não ser no conjunto e na plenitude das suas faculdades...É pois à imagem da humanidade colectiva, sintética, que devemos trabalhar incessantemente, para nos formarmos, quer como indivíduos, quer como corporações e nações. (Justice, Le Travail.)O meu patriotismo nada tem de absorvente nem de exclusivo, a minha devoção para com o meu país nunca irá ao ponto de sacrificar por ele os direitos das humanidade. (Fédér. et Unité en Italie.)Sacrificaria a própria França se o exigisse a civilização e o pensamento livre. (Lettre à Charle Edmond, 5 de Abril de 1857.)Seria homem para sacrificar a minha pátria à justiça se fosse forçado a escolher entre uma e outra. (Fédér. et Unité en Italie.)Onde está a Justiça, está a Pátria. (Lettre à Michelet, 23 de Março de 1856.)Através da justiça, cada um de nós se sente ao mesmo tempo pessoa e colectividade, indivíduo e família, cidadão e povo, homem e humanidade. (Justice, Les Personnes.)A CIVILIZAÇÃO EM CRISEO velho mundo cristão, monárquico, feudal, capitalista, está em dissolução; anda em bambochatas. A situaçao so será alterada por uma revolução integral nas ideias e nos corações. Vós e eu trabalhamos nisso, na Revolução; será a nossa honra perante a posteridade, se ela se lembrar de nós. Mas, julgais feita essa revolução? Uma revolução dura séculos. (Lettre à Michelet, 23 de Jan. de 1860.)A civilização atravessa realmente uma crise, como só encontramos outra análoga na história, a que determinou o aparecimento do Cristianismo. Todas as tradições estão vulgarizadas, todas as crenças abolidas; em compensação, o novo programa não se concretiza, quer dizer, ainda não entrou na consciência das massas; dai resulta o que chamo dissolução. (Lettre à M. Mathey, 29 de Out. de 1860.)A razão de Estado... flutua ao acaso, entregue a todas as sugestões do medo, da desconfiança, do velho antagonismo. Já não há princípios: o desespero dos espíritos impele-os para a guerra.As relações internacionais estão perturbadas...Mais algum tempo e dir-se-á que a França está podre...A Inglaterra tem princípios? Sim... destruir umas após outras as potências do continente.A Rússia tem princípios?... Se a Rússia tivesse princípios, compreenderia que não há transição entre a imoralidade da escravidão e o reconhecimento dos direitos do homem e do cidadão:... ela libertá-los-ia à primeira vista, revolucionariamente. (Justice., Philos. Popul., 1858.)Rússia: Essa revolução é doravante inevitável. (Justice, Posit. du Pr.) Não vejo como é que a revolução económica de 1848, que forneceu o princípio, possa operar essa revolução do império russo. (La Guerre et la Paix, liv. II, cap. VIII.) A Alemanha tem princípios? Esperemo-lo... mas a Alemanha sonha com a centralização. O que bem poderia significar, um dia, desnacionalização. (Justice., Philos. Pop.)Caminhamos a passos largos para a formação de cinco ou seis grandes impérios... uma vez formados esses impérios, já nada se moverá, tanto mais que, mais cedo ou mais tarde, eles entrarão em guerra uns com os outros. (Lettre à Gouvernet, 3 de Maio de 1860.)Uma vez centralizada a Alemanha, haverá, na Europa, o império francês... o império alemão... o império russo... e um mercantil, o império britânico... estes impérios, quando não se combaterem... garantirão reciprocamente a obediência dos seus súbditos e a exploração dos seus povos. (Just., Phil. Pop.)No dia em que a india, a Austrália, as ilhas da Oceânia, a África, todas as regiões actualmente exploradas pelos Europeus, tiverem proclamado a sua independência, dispondo soberanamente de todas as suas riquezas, elevando o preço das suas mercadorias e fazendo concorrência aos nossos próprios artigos, elas não nos entregarão mais nada a não ser contra o pagamento dum justo equivalente nesse dia, as nações encontrar-se-ão bloqueadas, umas pelas outras... então, se o equilíbrio entre a sua produção e o seu consumo não se estabelecer, se os surtos genéticos continuarem a ultrapassar os recursos industriais, não faltando os motivos políticos, a luta rebentará, inexorável, universal. (La Guerre et la Paix, liv. IV, cap. VII.)Digo-lhe, caro amigo, que tenho: poucas ilusões, e que não espero para amanhã para ver renascer o nosso país... Não, não. A decadência, e isto por um período de que não posso prever o fim... que não será menor do que uma ou duas gerações, eis o nosso destino...Eu passo da einquentena: só verei o mal...Algumas pessoas honestas aprovarão os meus trabalhos; talvez tenha a sorte de agrupar alguns espíritos, de formar um escol, no meio desta imensa derrocada; a minha ambição não vai mais longe. Será quando a hora do renascimento tiver soado, quando o pensamento público, lembrando os factos consumados, procurar justificá-los, que talvez se faça justiça à minha palavra. (Lettre à M. Mathey, 29 de Out. de 1860.)A máquina velha desorganiza-se, o mundo muda de forma... Parece-me, a mim próprio, que penetrei num outro hemisfério. (Lettre à Rolland, 22 de Junho de 1860.)Eu estaria enganado, poderei enganar-me, se esta crise não terminasse por uma explosão! A nossa época é bem a dos Césares: dissolução geral por um lado, renascimento imperceptível pelo outro: a renovação do antigo mundo greco-latino durou mais de sete séculos... A nossa, datando-a de Lutero ou de Erasmo, não tomará menos tempo. Já tivemos vários ataques: 1.º A filosofia..., 2.º A revolução de 89, 3º0 Ã era das monarquias constitucionais. Estamos a elas no federalismo e no socialismo. (Lettre à Félix Delhasse, 30 de Jan. de 1863.)A NECESSIDADE DUMA REVOLUÇÃOECONÓMICAEm vez da liberdade e da igualdade económica, a Revolução legou-nos, sob o privilégio de inventário, a autoridade e a subordinação política... a República tinha como finalidade construir a sociedade; só pensou no Governo. Deste modo, enquanto que o problema, posto em 89, parecia oficialmente resolvido, de mudança só havia a metafísica governamental, a que Napoleão chamava ideologia. A liberdade, a igualdade, o progresso, com todas as suas consequêneias oratórias, lêem-se no texto das constituições e das leis; não há vestígios deles nas instituições...Com tantas preocupações políticas, perdemos de vista a economia social. Foi assim que o próprio partido democrático, o herdeiro da primeira revolução, chegou a querer reformar a sociedade pela iniciativa do Estado, criar instituições pela virtude prolífica do poder, corrigir o abuso, numa palavra, pelo próprio abuso.Com estas fascinação a dominar as inteligências, a sociedade gira num circulo de decepções, impelindo o capital para uma aglomeração cada vez mais opressiva, o Estado para uma extensão cada vez mais dinâmica das suas prerrogativas.É necessária uma revolução nova, organizadora e reparadora, para preencher o vazio cavado pela primeira... (La Révol. au XIXe siècle, 2.º estudo.)Essa Revolução consiste em substituir o regime governamental pelo regime económico ou industrial.Por regime industrial entendemos, não uma forma de governo, em que os homens que se entregam aos trabalhos da agricultura e da indústria - empreendedores, proprietários, operários-se tornariam, por sua vez, casta dominante, como o foram outrora a nobreza e o clero, mas uma organização da sociedade... (Idem, 5.º estudo.)Foi conquistada pelos interesses uma supremacia sobre as questões de Estado. O que governa o mundo moderno, com efeito, não é nem um dogma, nem uma fé, nem uma tradição; não é nem o Evangelho, nem o Alcorão, nem Aristóteles, nem Voltaire; já não é a constituição de 1852, nem a, de 1793; é o «Livro de Razão», tendo na primeira página «Deve» e no verso «Haver»... (La Guerre et la Paix, liv. V, cap. III.)Entre a igualdade e o direito político e a igualdade e o direito económico existe uma relação íntima, de tal modo que, onde um dos dois é negado, o outro não tardará a desaparecer. (Capac. Pol., liv. II, cap. XIV.)Sob o regime de anarquia económica e de não-reciprocidade em que vivemos, a sociedade, mais ou menos nivelada quanto ao direito político, permaneceu em tudo o que resta feudal...Graças ao estabelecimento do sufrágio universal, o povo subiu, na ordem política, um furo; a burguesia pareceu descer em proporção. Mas o que esta perdeu por um lado, pode dizer-se que o recuperou pelo outro, o desenvolvimento da feudalidade industrial e financeira que... mantém em respeito a política, formando aqui uma espécie de compensação. Em conclusão, o país ficou por isso no mesmo ponto, constituído com base no unitarismo governamental e na anarquia económica, a partir dos quais se geram a inferioridade do trabalho relativamente ao capital, o antagonismo entre as classes, a contradição nas leis...Assim, por muito tempo que a anarquia económica - que serve de contrapeso à centralização governamental - seja considerada como um dos pilares da sociedades, a contradição que acabo de indicar será irresolúvel. (Cap. Pol., liv. III, cap.IX.)Sendo pois flagrante a divisão da sociedade moderna em duas classes - uma de trabalhadores assalariados, a outra de proprietários-capitalistas-empreendedores - uma consequência dai deveria resultar, que não deveria surpreender ninguém; é que as pessoas perguntaram a si próprias se esta distinção era efeito do acaso ou da necessidade; se ela constava dos verdadeiros dados da revolução.Esta questão, que, para os filósofos, não é nova, devia surgir entre as massas operárias, no dia em que uma revolução política as colocasse, pelo sufrágio universal, ao nível das classes burguesas, em que elas se aperceberiam do contraste entre a sua soberania política e o seu estado social...É por isso que a democracia francesa, no séc. XIX, se distingue de todas as democracias ante,riores: o socialismo não é outra coisa...Quer a burguesia o saiba, quer o ignore, as suas funções acabaram...A distinção actual, aliás perfeitamente estabelecida, entre as duas classes, operária e burguesa, é um simples acidente revolucionário. Ambas devem penetrar-se reciprocamente no dia em que o povo, constituído em maioria, tiver conquistado o poder e proclamado, segundo as aspirações do novo direito e as fórmulas da ciência, a reforma económica e social; esse será o dia da fusão definitiva.A causa dos camponeses é a mesma que a dos trabalhadores da indústria... Os seus adversários são os mesmos. (Cap. Polit., liv. I, cap. II.)Como a causa é comum entre os trabalhadores das cidades e os dos campos, é-o igualmente entre a Democracia operária e a classe média: pudessem elas compreender uma e outra que a sua salvação está na sua aliança! (Idem, liv. I, cap. XVI.)O povo, por ódio à aristocracia, desconfiando da classe média, desprezando a República Vermelha e moderada, formou o Império.Como o povo de César, ele espera que o seu patrão o leve a devorar o burguês... Mas o Império poderá resistir sempre? Conseguirá ele, durante muito tempo ainda, tornear as dificuldades de todâ a natureza que o assediam, impor uma mudança ao seu destino e enganar a fome do monstro?...O conjunto destes expedientes, que é fácil ver, constitui precisamente a última vitória do proletariado, do que nós chamámos o governo dos instintos: é a conversão progressiva da feudalidade industrial em império industrial, a realização do programa comunista... Para nós, a quem uma solução deste gênero não satisfaria, porque ela não garante nada... cingir-nos-emos, depois de ter indicado a marcha da nova revolução, a apresentar a sua fórmula definitiva; segundo os sintomas mais significativos do tempo actual... A propriedade das empresas, e a sua direcção, em vez de permanecerem, como geralmente sempre foram, individuais, poderão vir a ser colectivas, a ponto de fornecerem, por um lado, às classes laboriosas uma decisiva garantia de emancipação; por outro lado, às nações civilizadas, uma revolução nas relações entre o trabalho e o capital, por conseguinte a substituição definitiva, na ordem política, da razão de Estado pela justiça?Da resposta que for dada a estas questões depende todo o futuro dos trabalhadores. Se esta resposta for afirmativa, um novo mundo se abre à humanii dade... (Man. d'un Spéc., concl. fin.)PLURALISMO E TRANSFORMAÇÃO SOCIALNinguém, que eu tenha conhecimento, pensou que a questão, tanto para a política como para a economia, era tendencial, muito mais que constitucional; que se tratava, antes de tudo, de orientar, e não de dogmatizar...Nenhuma das teorias socialistas e governamentais que são propostas apreendeu este ponto capital da questão. Longe disso: todas elas constituem a negação formal dele. O espírito de exclusão, de absolutismo, de reacção, é o carácter comum dos seus autores. Com eles, a Sociedade não vive; está sobre o banco da dissecação.Fazendo irradiar uma ideia fixa, sobre as diversas partes do corpo social, eles deviam chegar, e efectivamente chegaram, a reconstruir a sociedade com base num plano imaginário, aproximadamente como aquele astrónomo que, por respeito aos seus cálculos, restaurava o sistema do mundo... (La Rév. au XlXe sècle, 3.º estudo.)A realidade é, por natureza, complexa; o simples não sai do ideal, não chega ao concreto. (Princ. Fédér., l.ª parte, cap. III.)O nosso sistema social é complicado, muito mais do que se julga. Se obtivemos todos os dados, temos necessidade de os coordenar, de os sintetizar, segundo as suas leis próprias.Que o leitor evite ver neste antagonismo, nestas oposições, nestes equilíbrios, um simples jogo do meu espírito. Eu sei que uma teoria simplista, como o comunismo ou o absolutismo de Estado, é duma concepção muito mais fácil que o estudo das antinomias. Mas o erro não é meu, simples observador e investigador de séries. Ouço dizer, pela voz de certos reformadores: suprimamos todas estas complicações de autoridade, de liberdade, de posse, de concorrência, de monopólio, de impostos, de balança do comércio, de serviços públicos; criemos um plano de sociedade uniforme, e tudo será simplificado, resolvido. Eles raciocinam como o médico que dissesse: com elementos tão diversos (ossos, músculos, tendões, nervos, vlsceras, sangue arterial e venoso, suco gástrico, pancreático, quilo, humores lacrimais, sinoviais, gases, líquidos, e sólidos) o corpo é ingovernável. Reduzamo-lo a uma matéria única, sólida, resistente - os ossos, por exemplo - e a higiene e a terapêutica tornar-se-ão um jogo de crianças. De acordo: somente, a sociedade, tal como o corpo humano, não pode ossificar-se.Nela se descobre um pensamento, uma vida intima colectiva que evolui fora das leis da geometria e da mecânica; que repugna assemelhar ao movimento rápido, uniforme, infalível duma cristalização, que a lógica vulgar siloglstica, fatalista, unitária, é incapaz de justificar, mas que se explica maravilhosamente com a ajuda duma filosofia mais vasta, admitindo num sistema a pluralidade dos princípios, a luta dos elementos, a oposição dos contrários e a síntese de todos os indefiníveis e absolutos...É uma prova de que a fatalidade não governa a sociedade; de que a geometria e as proporções aritméticas não dirigem os seus movimentos, como a mineralogia e a química; que há nela, uma vida, uma alma, uma liberdade que escapa às medidas precisas, fixas, que governam a matéria.O materialismo, naquilo que diz respeito à sociedade é absurdo... (Th. de la Propr., cap. IV.)Independentemente das evoluções orgânicas constatadas - e em que todas revelam necessidades da natureza, da nossa constituição intelectual e social há razões para acreditar que existe, na humanidade, um movimento mais profundo, que abrange todos os outros e os modifica: esse movimento é o da liberdade e da justiça. (Justice, Progrès et Décadence.)Tal como o indivíduo é dono da sua vida e da sua saúde, as gerações têm o poder, por um falso regime, de se corromperem e de se adulterarem, enfim como acontece com as raças que vegetam... quer elas sejam vencidas pelos obstáculos que encontrou a sua espontaneidade, quer, por um errado uso do seu livre arbítrio, elas sejam desencaminhadas no seu desenvolvimento; do mesmo modo concebo a possibilidade para toda a espécie duma aberração definitiva e irremediável. (Lettre à Langlois,, 18 de Maio de 1850.)Este progresso, que é a minha lei, consiste não numa evolução fatal da humanidade, mas numa libertação indefinida de toda a fatalidade. (Justice, Sanction Morale.)SOCIALISMO OU COMUNISMO?Comunismo?Julgo que não estamos separados do comunismo puro, político e económico, senão pela espessura duma constituição, quer dizer, duma folha de papel. (Capac. Pol., liv. III, cap. IV.)Sou do partido do Trabalho, contra o partido do Capital; e trabalhei toda a minha vida.A democracia governamental e comunitária pode dar ao mundo, se o mundo lho permitir, uma última representação da autoridade: ajudá-la-ei a sair do caos que resultará; trabalharei na reparação das suas ruinas; mas não ocasionarei nenhuma reacção ao comunismo.O principio da Revolução, é a Liberdade. Liberdade!, isto é: 1.º libertação política, pela organização do sufrágio universal, pela centralização indepenidente das funções sociais, pela revisão perpétua, fine ssante, da Constituição; 2.º libertação industrial, e pela garantia mútua do crédito e do mercado. (Confes. d'un Révol., cap. XXI.)Aceitará a nação, suportará ela, contrariamente ao seu carácter e às suas tendências, a condição anormal que a improvidência dos seus chefes lhe prepara? Consentirá ela, por medo ao comunismo, em voltar ao antigo estado feudal?É preciso que o povo francês se dê ao prazer dum ensaio do comunismo ditatorial; ele não chegará à síntese senão pela antítese... Voltaremos então à carga com as nossas ideias mutualistas: quando o povo estiver farto de comunidade e de fraternidade... (Lettre à Ch. Edmond, 25 de Fev. de 1850.) Comunistas, igualitários, todos vós patriotas do coração e da inteligência, até quando sereis iludidos por esses tartufos políticos, espiões saídos da banda de Héron e de Fouché, imitadores dos Brutus e dos Robespierre? (Avertiss. aux Propr.)O culto dos grandes homens... é... um resto de idolatria... As nações devem livrar-se do culto das individualidades... (Napoléon 1er.) Não se impõe o absolutismo do Estado sem criar um déspota. (Justice, L'Éducation). Nero - coisa horrível que um democrata nunca deve esquecer Nero é o idolo popular. (Justice, De la sanction morale.)Comunistas, a vossa missão é grande e sublime; representais o mais antigo elemento da síntese social. Por isso, não há um legislador, um filósofo, um socialista, dotado de algum gênio, que não vos tenha pertencido. Moïse, Pitágoras, Minos, Licurgo, Platão, e uma multidão de outros passaram pela comunidade...- A comunidade como elemento integrante da composição, que se prepara e já se efectua, deve ter os seus representantes e os seus órgãos: e tal é, comunistas, a razão da vossa reaparição.Operários, trabalhadores, homens do povo, quem quer que sejais, a iniciativa da reforma pertence-vos. Sois vós quem realizará essa síntese ou composição social, que será a obra-prima da criação; e vós, sozinhos, podeis realizá-la. (Avertis. aux Prop.)Dir-se-ia hoje que o povo se recolhe e recapitula as suas crenças. As observações foram numerosas, os ensaios multiplicados, os infelizes da nossa espécie esgotaram a caixa de Pandora: um vasto trabalho de composição e de síntese começa. Todos os antigos sistemas, restituídos por um momento à vida, têm os seus representantes: monoteístas, dualistas, panteístas, materialistas e místicos, comunistas, proprietários, aristocratas e republicanos, actores dum drama imenso, tiveram um encontro no nosso século para o desenlace. (Avertis. aux Propr.)Ou socialismo?Aceitai por amigos correligionários e socialistas, todos os que se entreguem a vós como tais, e sem os submeter a exame... E não vos ocupeis, tal como eu, senão a bem definir, a bem apresentar as cinco ou seis grandes questões que constituem o esqueleto do sistema. (Lettre à Langlois, 14 de Jan. de 1862.)O socialismo, como todas as grandes ideias que, abrangendo a integralidade da ordem social, podem ser consideradas sob uma multidão de pontos de vista diversos, o socialismo não é somente a extinção da miséria, a abolição do capitalismo e do salariato, a transformação da propriedade, a descentralizarão governamental, a organização do sufrágio universal, a soberania efectiva e directa dos trabalhadores, o equilibro das forças económicas, a substituição do regime legal pelo regime contratual, etc. Ele é, em todo o rigor dos termos, a constituição das fortunas modestas. (Confes. d'un Révol., post-seriptum.)Eu afirmo o progresso e, como incarnação do Fprogresso, a realidade do homem colectivo e, como consequência desta realidade, uma ciência económica: eis o meu socialismo. (Philos. du Progrès, cap.VII.)Hoje mesmo faço claramente profissão de socialismo, e mais do que nunca creio no seu triunfo.Mas, nas discussões económicas, acontece que se chama socialismo à teoria que tende a sacrificar o direito individual ao direito social, do mesmo modo que, pelo contrário, se chama individualismo à teoria que tende a sacrificar a sociedade ao indivíduo. Neste caso, nego o socialismo, tal como nego o individuaismo... (Lettre à Villiaumé, 24 de Jan. de 1856.)O socialismo começou por estender a sua base de operações e por hastear a sua bandeira por toda a Europa. A questão social é posta em Paris, em Londres, em Roma, em Milão, em Genebra, em Berlim, em Viena, em Munique, em Breslau, na Cracóvia, de Cádis a Moscovo; ao longo do Sena, do Reno, do Danúbio. (Programme Révol.)Para mim, o socialismo é o termo formal, e expressão completa da República. (Mélanges II.)SINDICALISMO E DEMOCRACIA INDUSTRIALA Revolução pela alta sociedade é, iiievitavelmente, a revolução pelo bel-prazer do príncipe, pela arbitrariedade dum ministro, pelas tentativas duma assembléia, pela violência dum clube; é a revolução pela ditadura e pelo despotismo... Assim a querem os brancos, os azuis, os vermelhos; neste ponto, todos estão de acordo.A revolução pela iniciativa das massas é a revolução pelo acordo dos cidadãos, pela experiência dos trabalhadores, pelo progresso e difusão das luzes do saber, a revolução pela liberdade,... a revolução por baixo, a verdadeira democracia...O socialismo entregou-se completamente à ilusão jacobinista... Em vez de ensinar ao povo organizar-se por si próprio, de fazer apela à sua experiência e à sua razão, pediu-lhe o poder. (Conf. d'un Révol., cap. III.)Pelo menos, dizei aos partidários da iniciativa governamental: reconhecereis que, para realizar a revolução prometida - pelo desenvolvimento das antinomias - o poder seria um poderoso auxiliar. Então, por que razão vos opondes a uma reforrfia aue, colocando o poder nas mãos do povo, secundaria tão bem os vossos objectivos?...Se possuis a ciência social, sabeis que o problema da associação consiste em organizar, nao unicamente os improdutivos (restam, graças ao céu, poucas coisas a fazer deste lado) mas ainda os produtores, e, devido a esta organização, submeter o capital e subalternizar o poder... Ora, para combater e reduzir o poder, para o colocar no lugar que lhe convém - na sociedade - não serve para nada mudar os detentores do poder... é preciso encontrar uma combinação agrícola e industrial por meio da qual o poder, hoje dominador da sociedade, se torne escravo dela.... eis precisamente aquilo em que .vós não consentiu. Como não podeis conceber a sociedade sem hierarquia, transformaste-vos nos apóstolos da autoridade; adoradores do poder, só pensais em fortificar o oder e em amordaçar a liberdade...O problema consiste então, para as classes trabalhadoras, não em conquistar, mas em vencer, ao mesmo tempo, o poder e o monopólio, o que equivale a dizer: em fazer surgir das entranhas do povo, das profundidades do trabalho, uma autoridade maior, um acontecimento mais poderoso, que envolva o capital e o Estado, até os subjugar. Qualquer proposta de reforma que não satisfaça esta condição, não passa de mais um flagelo, uma vergasta em sentinela, vingam vigilantem, dizia um profeta, que ameaça o proletariado. (Contr. Écon., cap. VII.) - Podeis proibir as associações operárias?... por toda a parte as classes trabalhadoras se estão a organizar... Enquanto que deliberais, a revolução cumpre-se. (Le Droit au Tr. et à la Propr.) Os próprios operários pedem... sindicatos executivos... (Capac. Pol.)Não há ainda mais de quinze anos, os homens que observavam com atenção o movimento económico faziam sobressair, no seio da paz, a incoerência dos elementos sociais; eles mostravam o seu antagonismo e as suas inumeráveis contradições. Era a anarquia industrial... Uma tal situação, diziam eles, é eminentemente crítica, e não pode manter-se; ele deve fatalmente, pelo jogo dos sues princípios, conduzir, sob a acção preponderante do capital, a uma formação corporativa, a uma feudalidade industrial. A feudalidade industrial existe pois, reunindo todos os vícios da anarquia e da subalternização...A feudalidade industrial deve suceder, segundo a lei das antinomias históricas, uma democracia industrial.Mas, qual será o agente desta revolução?A história revela-o. Entre a antiga feudalidade e a revolução houve, como regime transitório, o despotismo. Entre a nova feudalidade e a liquidação definitiva teríamos então uma concentração económiea-falemos claro: um Império industrial...Anarquia ou feudalidade, com efeito, a história demonstra-o, é sempre a falta de equilíbrio, o antagonismo, a guerra social, para os quais, no estado actual dos espíritos, não se saberia imaginar o remédio senão por meio duma concentração mais poderosa, dum terceiro termo seriário, a que chamaremos, sem nenhuma intenção maligna, império industrial.Tudo nos impele nesse sentido: a tradição monárquica, as analogias da história, o institnto popular, os preconceitos da democracia.Aqui, pelo menos teremos o acordo, a unidade, tão querida dos jacobinos, o silêncio e a paz. Mas teremos a liberdade? Teremos a igualdade? Teremos o direito?...Deixemos de lado os Saint-Simonianos, iniciadores da nova feudalidade e promotores dum império impossível, deixemos com eles os Ultramontanos, os Anglo-Saxões e os Eslavos, todos fieudais da velha guarda; e terminemos, com e contra todos, a Revolução começada em 89, estabelecendo o equilíbrio económico e social isto é... a república industrial.Que ninguém se assuste com a palavra. Não depende de mim designar de outro modo o quarto termo desta série económica cuja evolução impressiona todos os olhares: anarquia industrial, feudalidade industrial, império industrial, república industrial.Destes quatro termos, o primeiro está perto do seu fim; o segundo está no seu apogeu, o terceiro em eclosão, o quarto no estado fetal... (Man. du Spéc., introdução.)Acreditamos numa transformação radical da sociedade, no sentido da Liberdade, da Igualdade entre as pessoas, da Confederação dos povos. O que constitui a base de toda a empresa industrial, de toda a especulação mercantil ou financeira é a divisão do trabalho, o grupo operário, a solidariedade entre a produção e o consumo, tudo coisas que indicam uma acção, ou função colectiva. Que a colectividade adquira então a consciência de si própria, e em vez de servir para a exploração individual, ela não quererá mais produzir senão para si...Quanto a isso, não nos enganemos: o organismo industrial, destruido em 89, desaparecerá para dar lugar a um outro, mais profundo, mais vasto, livre de privilégios e retemperado na liberdade e na igualdade popular. Não é com retórica vã que o declara: é a necessidade económica e social. Aproxima-se o momento em que já não poderemos caminhar senão segundo estas novas condições. Outrora, governo, capital, propriedade, ciência, mesmo o trabalho, tudo era casta; agora tudo tende a tornar-se povo... Será possível admitir que este movimento societário, resultado, não das teorias utopistas, mas das necessidades económicas, e que invade todos os ramos da produção, permaneça eternamente fechado ao operário?...Deveremos acreditar que a sociedade de comércio, generalizando-se com esta força irresistivel, tem por fim providencial ressuscitar o regime das castas... e o proletariado?...Daqui a meio século, todo o capital nacional terá sido mobilizado, todo o valor hipotecado; servindo de instrumento à produção, será registado sob uma razão social; o campo da propriedade individual será reduzido aos objectos de consumo...Qualquer que seja o aspecto segundo o qual consideramos as coisas, pelo lado político ou pelo lado económico, sob o ponto de vista da mecânica tal como da comandita, é cada vez mais evidente que caminhamos, através duma aparência de restauração feudal, para uma democracia industrial. (Man. du Spéc., concl. final.)A fórmula superior da associação de modo nenhum tem que se ocupar com o capital, objecto das contas particulares; mas deve apoiar-se unicamente no equilíbrio da produção, nas condições da permuta, na redução progressiva dos preços de revenda, única fonte do progresso e da riqueza... determinar as relações de indústria para indústria, de trabalhador para trabalhador, de província para província, e de povo para povo. (Contr. Écon., cap. VI.)Em primeiro lugar, compreende-se que o problema não poderia encontrar solução numa multidão fogosa, obediente aos simples instintos. É preciso, neste caso, para iniciadores imediatos das classes trabalhadoras... homens saldos do seu seio... Trata-se po,is, e aí reside toda a dificuldade, de formar um agrupamento de operários, dotados duma certa dose de moralidade e de inteligência, capazes de conceberem as leis da economia social, com a firme vontade de as seguir, sem lhes misturar nada das fantasias e alucinações da época; trata-se, numa palavra, em relação à questão que acabámos de apresentar, de formar, não uma massa de capitais, mas uma terra de homens ... (Man. du Spéc., concl. fin.)Nós afirmamos a possibilidade da educação do povo (Lettre à Ch Edmond, 21 de Janeiro de 1852.)A instrução que exige a nova democracia... é uma educação que contribui, com as instituições de mutualidade, com a associação operária, para manter um certo nível entre as corporacões, as constituições e as fortunas. (Capac. Pol., liv. III, cap. VIII.)O princípio de associação... e o princípio - mais geral ainda e mais poderoso, da mutualidade., pelo qual a democracia operária consagra desde agora a solidariedade dos seus grupos - são o prenúncio da reeonstituição política e económica da sociedade... É aí, na energia combinada destes dois princípios, a associação e a mutualidade, que se encontra o sistema de garantias morais e materiais pelo qual a civilização aspira... (Capac. Pol., liv. III, cap. IX.)Fora de qualquer consideração económica exterior, de todo o interesse preponderante, a associação para si própria é um acto de pura religião sem valor positivo, um mito...A sua missão consistirá sobretudo na gestão dos grandes instrumentos de trabalho. (La Révol. au XlXe siècle, 3.º estudo.)Quem não vê que a associação -que a democracia operária persiste em invocar como o fim de toda a servidão e como a forma superior da civilização - não é e não pode ser outra coisa senão a mutuazidade? Com efeito, a mutualidade, de que tentámos traçar o esboço, não é o contrato social por excelência, ao mesmo tempo político e económico, sinalagmático e comutativo, que abrange, simultaneamente, nos seus termos tão simples, o indivíduo e a família, a corporacão e a cidade, a venda e a compra, o crédito, o seguro, o trabalho, a instrução e a propriedade, qualquer profissão, qualquer transacção, qualquer serviço, qualquer garantia...Sob o ponto de vista pessoal, a associação mutualista é pois, por natureza, ilimitada, o que é o contrário de qualquer outra associação. Acontece o mesmo quanto ao seu objectivo...A associação mutualista... admite, enquanto mutualista, toda a gente. e tende para a universalidade; ela é formada não directamente com o objectivo dum lucro, mas duma garantia...A associação comunista, enquanto instrumento revolucionário e fórmula do governo, tende também para universalidade e para a perpetuidade; mas ela não deixa nada como coisa particular aos associados! (Capac. Pol., liv. II, cap. XIV.)Constatemos uma última vez a necessidade... da reintegração do povo nos domínios criados pelo seu trabalho. (Man. d'un Spéc., consid. finais.)É preciso democratizar a banca, as caixas de seguros, fixar um salário mínimo, abolir as alfândegas, as proibições, as tarifas: estas ideias já estão na ordem do dia... Para que o povo subsista e a sociedade dure, é preciso centralizar o comércio, a agricultura e a indústria; proporcionar a produção às necessidades,... ao mesmo tempo, extinguir progressivamente as funções anormais, subversivas, ou repetindo a ideia, é preciso regulamentar a oficina, policiar o mercado, republicanizar, como dizia Cambon, a propriedade. (Créat. de l'O., cap. II.)Liquidar as sociedades existentes... e substituir as comanditas dos capitalistas pela mutualidade dos serviços e pela associação dos trabalhadores... para operar esta transformação, basta... um pequeno número de modificações a introduzir nos estatutos das actuais companhias... Quanto à transferência da propriedade, sem ocasionar luta que colocaria a burguesia à mercê do povo, há unicamente necessidade duma simples operação de amortização...O trabalho deve amortizar todos os capitais. (Man. dun Spéc., consid. finais.)Esgotar as consequências do regime proprietário desenvolvendo os direitos de todos, tal é, na minha opinião, a unlca maneira racional de nos elevar-nos calmamente a uma forma social sintética. Portanto, a questão resume-se a acelerar o movimento, a fazer viver depressa a sociedade durante um certo lapso de tempo, e a fazê-la realizar numa geração o trabalho de vários séculos... (Avertis. aux propr.)Para mudar a propriedade só temos necessidade... do abaixamento da taxa de lucro, da extensão do domínio público, da vigilância administrativa, da centralização da agricultura, do comércio e da indústria, com as medidas acessórias de política e de ordem.Para reformar o nosso sistema político, só pedimos... a divisão, a especialização, a coordenação e a responsabilidade das funções e dos poderes, de acordo com as leis da Economia... (Créat. de l'O., cap. VI.)Trata-se simplesmente - através da redução do aluguer dos capitais e das habitações, pela facilidade e insignificância da taxa de desconto, pela eliminação do parasitismo, pela extirparão da agiotagem, pelo policiamento dos entrepostos e dos mercados, pela diminuição dos preços de transporte, pelo equilíbrio dos valores, pela instrução superior dada às classes trabalhadoras, pela preponderância definitiva do trabalho sobre o capital, pela justa medida da apreciação concedida ao talento e à função - trata-se, digo, de restituir ao trabalho e à honestidade o que lhes retira indevidamente a prelibação capitalista. (Capac. Pol., liv. II, cap. XV.) Mas pode fazer-se, na condição económica actual as nações... com que a expropriação duiyia nação inteira apareça como o único meio... Se jamais se reacender a guerra entre a burguesia e o proletariado e este for o senhor, porque razão não faria o proletariado uso... da vitória?... Uma guerra para a exploração e para a propriedade, uma guerra social... o direito da força está longe de ter dito a sua última palavra, ele sozinho pode terminar com o debate suscitado... quer por uma batalha quer por uma constituição consentida... (La Guerre et la Paix., liv. II, cap. XI.)FEDERALISMO E COMPETIÇÃO PACIFICATodas as minhas ideias económicas, elaboradas desde há vinte e cinco anos, podem resumir-se a estas três palavras: Federação Agricolo-Industrial.Todos os meus objectivos políticos se reduzem a uma fórmula semelhante: Federação Política ou Descentralização.E como não faço das minhas ideias um instrumento de partido, nem um meio de ambição pessoal, todas as minhas esperanqas, da actualidade e do futuro, são expressas por este terceiro termo, corolário dos dois outros: Federação progressiva. (Pr. Féd. l.ª parte, cap. XI.)Em resumo, quem diz liberdade, diz federação ou não diz nada.Quem diz República, diz federação ou não diz nada.Quem diz socialismo, diz federação, ou novamente, não diz nada. (Pr. Féd., 2.ª parte, cap. III.)Desafio quem quer que seja a fazer uma profissão de fé mais nítida, com mais elevado alcance e, ao mesmo tempo, com maior moderação. Vou mais longe: desafio todos os amigos da liberdade e do direito a repelirem aquela.A era dita constitucional: desaparecerá perante a em federativa e social. (Princ. Féd., l.ª parte, cap. IX.)O princípio, chamado, quanto a mim, a regular a política moderna, não é outro senão o princípio de federação, corolário do da separação dos poderes - o qual, por sua vez é a base universalmente reconhecida de todo o governo livre e regular, e com mais forte razão de toda a instituição republicana - ; este principio tem como oposto o princípio da aglomeração dos povos e da centralização administrativa. Deste modo o direito público e o direito internacional caminham concordantemente, tal é a lei dum, tal será a do outro: aglomeração e centralização, ou federação dos povos e separação dos poderes. (Fédér. et Unité en Italie.)Servimos a mesma causa, e trabalhamos, cada um do nosso lado e à nossa maneira, na mesma obra.Faço apelo, no meu programa, a todos os homens de boa vontade. É preciso que o eco revolucionário desperte em todos os cantos da Europa.Seria um começo de união entre a França e a Rússia, dois países, afinal de contas, nascidos para se compreenderem.Enquanto que os nossos príncipes fazem imundlcies e massacres, comecemos pelo nosso pensanto: a federação europeia. (Lettre à A. Harzen, de Março de 1860.)Qualquer que seja o poder encarregado dos destinos da França, não há para ele outra política a seguir, outra via de salvação: que dê o sinal das Federações europeias, que se faça o seu aliado, o chefe e o modelo.(Princ. Fédér., concl.) O século XX abrirá a era das federações, ou a humanidade recomeçará um purgatório de mil anos. (Princ. Féd., l.ª parte, cap. XI.)Se isto acontecesse de outro modo o mundo voltaria ao caos. Viria o dia em que, pela guerra, não haveria mais, como na aurora da criação, do que vazio e átomos. (Idem, liv. V, cap. VI.)A Humanidade já não quer a Guerra... (La Guerre et la Paix., concl. ger.)A sabedoria dos indivíduos, das escolas, das igrejas, dos Conselhos de Estado é aqui impotente. A especulação política e socialista teve já a sua época. A guerra, do mesmo modo que a religião, do mesmo modo que a justiça, do mesmo modo que o trabalho, a poesia e a arte, foi uma manifestação da consciência universal.Em matéria económica, a jurisdição da guerra é incgmpetente. Resta tomar uma única resolução: organizar a partir doutros dados o antagonismo humanitário... Somente neste sentido, a paz, uma paz emulativa, em que as forças em combate se reproduzem..., a paz é a conclusão lógica da evolução bélica da humanidade. (La Guerre et la Paix, liv. V, cap. I.)O antagonismo tem por objectivo a produção duma ordem superior, dum aperfeiçoamento sem fim. A este respeito... o trabalho oferece ao antagonismo um campo muito mais vasto e fecundo que a guerra. (Idem, liv. V, cap. V.) Pelo trabalho, muito mais que pela guerra, o homem manifestou a sua coragem; pelo trabalho muito mais do que pela piedade caminha a justiça; e se algum dia a nossa diligente espécie alcançar a felicidade, será ainda pelo trabalho. (Justice, Le Travail.)...A fim de assegurar a paz, manter as energias sociais em lutas permanentes... (Justice, Les Idées.)Conclui-se daí que o antagonismo que aceitamos como lei da humanidade e da natureza, não consiste essencialmente, para o homem, num pugilato ou numa luta corpo a corpo. Ele pode ser, afinal, uma luta de destreza e de progresso...Nestas novas batalhas, não teremos que apresentar menos resolução, menos devoção... (La Guerre et la Paix, liv. V, cap. V.)A humanidade trabalhadora soz:inha é capaz de acabar com a guerra, criando o equilíbrio !económico, o que supõe uma revolução radical nas ideias e nos corações. (La Guerre et la Paix, concl.)DEMOCRATIZAÇÃO E ENSINO TRABALHISTAToda a educação tem por objectivo produzir o homem e o cidadão-segundo uma imagem, em miniatura, da sociedade - pelo desenvolvimento metódico das faculdades físicas, intelectuais e morais da criança. Noutros termos: a educação é a criadora de costumes no sujeito humano... A educação é a função mais importante da sociedade... Aos homens só é necessário o preceito, à criança é necessásia a aprendizagem do próprio dever, o exercício da consciência como do corpo e do pensamento. (Justice, L'Éduc.)O destino social, o enigma humano encontra-se nesta palavra: educação, pro,greso. (Contr. Écon., cap. VIII.)A instrução do homem deve ser constantemente combinada e concebida, de modo a que dure, aproximadamente, toda a vida. (Cap. Pol.)Reúno-me, sem reservas, aos homens honestos de todos os partidos,... compreendendo que democracia é... demopedia, educação do povo. (Carnets.)Nenhuma revolução será fecunda, se a instrução pública recriada não se tornar a sua coroação. (Créat. de l'O.)Para elevar a condição do operário é preciso começar por elevar o seu valor: sem isto, não há salvação (que os trabalhadores não duvidem). (Justice, Le Travai1.)O que pedimos... é uma educação seriamente liberal, à altura do sufrágio universal, e que concorra, com as instituições de mutualidade e de garantias, com a associação operária e a federação das comunas e províncias, para manter um certo nível entre as corporacões, as condições e as fortunas... Queremos trabalhadores civilizados e livres. (Capac. Politique, livro III, cap. VIII.)Há pois razão... para proceder à educação do povo e a organização dos trabalhadores. Sim, a desigualdade existe ainda nas capacidades como existe ainda nas fortunas; mas ai são perturbações acidentais da emonomia social, não são leis da natureza... Do mesmo modo que o nivelamento das condições se opera pelo progressivo melhoramento da sorte dos trabalhadores, do mesmo modo... o equilíbrio das inteligências é provocado pela instrução incessante das massas. (3e Mém.)O sistema da educação tem que ser recomeçado... Separar, como é feito hoje, o ensino da aprendizagem... é reproduzir, sob uma outra forma, a separação dos poderes e a distinção das classes; os dois mais enérgicos instrumentos da tirania governamental e da subalternização dos trabalhadores... As nossas escolas. quando não são estabelecimentos de luxo ou pretextos para sinecuras, são os seminários aristocráticos... Numa democracia real.... cada pessoa deve ter debaixo de mão o alto e o baixo ensino. (Idée Gén. de la Révol.) Suponhamos a França, sete milhões e meio de indivíduos, rapazes e raparigas... a quem se trata de dar... a instrução literária, cientifica, moral e profissional... Semelhante objectivo só pode ser atingido por meio da combinação da aprendizagem com a escolaridade. (Pr. Fédér., cap. XI, 1863.)O trabalho... resumindo a realidade e a ideia, apresenta-se... como modo universal de ensino... de todos os sistemas de educação, o mais absurdo é o que separa a inteligência da actividade e separa o homem em duas entidades impossíveis: um abstraidor, e um autómato... Se a educação fosse, antes de tudo, experimental e prática, reservando os discursos somente para explicar, resumir e coordenar o trabalho; se permitissem aprender pelos olhos e pelas mãos a quem não pudesse aprender pelos olhos e pela memória, em breve veríamos... multiplicarem-se as capacidades. (Contr. Écon., cap. IV.)Esperar pacientemente, como pastor, espiar a natureza, compreender o pensamento no momento da sua eclosão, são coisas que não se praticam nas nossas escolas: o método concebido no cérebro dum ministro ou dum comissário está traçado... Como não se vê que, em todos os homens, a actividade obedece a uma tendência particular? Que esta tendência, necessariamente especial, é o principio da capacidade futura; que cabe ao mestre adivinhá-la, apoderar-se dela, colocar-se nela como num lar, para daí operar em todos os sentidos, e segundo todas as direcções. (Créat. de l'O., cap. VI.)O ensino deve ser ministrado completamente... de modo que a escolha da profissão e da especialidade pelo operário aconteça da mesma maneira que para o politécnico, após a conclusão do curso completo de estudo... tudo com método e em conjunto, ou nada: é a lei do trabalho tal como do saber... Mas por que meio se poderá realizar um plano tão vasto... esta politecnia da aprendizagem?... Devendo a instrução operári:a ser integralmente dada a todos, todo o estabelecimento de grande produção... é ao mesmo tempo... uma oficina de trabalho e un-ia teoria de aplicação. Em duas palavras, a aprendizagem politécnica e o acesso a todos os graus: eis em que consiste a emancipação do trabalhador. (Justice, Le Travail.)Depois de ter unificado e centralizado, é preciso democratizar o ensino e fazer intervir... todo o corpo dos professores na administração dos colégios e na direcção do ensino. (Créat. de l’O., cap. VI.)Compreende-se que as associações operárias sejam chamadas a desempenhar aqui uma importante missão. Postas em ligação com o sistema:de instrução pública, elas tornam-se, ao mesmo tempo, centros de produção e centro de ensino... Sob o regime de autoridade política da feudalidade industrial e financeira, nada ou quase nada do que acabo de dizer é praticável. (Capw. Pol.)JUSTIÇA, LIBERDADE E TOLERÃNCIANós exagerámos no supérfluo, e ainda não temos o necessário... (La G. et la P., liv. IV, cap. II.)Fazer dinheiro, enriquecer, rodear-se de luxo, tornou-se por toda a parte uma máxima de moral e de governo. Chegou-se ao ponto de pretender que o meio de tornar os homens virtuosos, de fazer cessar o vício e o crime, era espalhar por toda a parte o conforto ...As nações que perseguem como lei suprema a riqueza material e as voluptuosidades que ela ocasiona, são nações que estão em deelínio. (La G. et la P., liv. IV, cap. III.)A propriedade, o dinheiro, o tráfico, a diminuição dos talentos, a arte de agrupar os números e de organizar estatísticas não bastam para fazer viver e caminhar uma nação... É assim que a compos;ição química é impotente para, suprir a força desconhecida que se chama a vida. (Justice, Position du Problème.)Ã democracia francesa resta tomar uma iniciativa... É com a constituição do direito económico, a criação duma nova ordem espiritual. (La G. et Ia P., concl.)O que é preciso para as novas gerações é uma unidade que exprima a alma da sociedade, unidade espiritual, ordem inteligível que nos una através de todas as forcas da nossa consciência e da nossa razão, e no entanto nos deixe o pensamento livre, a vontade livre, o coração livre. (Capac. Pol., liv. II, cap. XIV.)Imanência e realidade da justiça na humanidade: tal é o grande ensinamento... A moral, expressão da liberdade e da dignidade humana, existe por si própria. A justiça está em vós, simultaneamente realidade e pensamento soberano, (dai) o papel que ela desempenha como principio, móbil e fim da civilização, o carácter justiceiro da nova ordem moral. (La G. et la P., concl. ger.) O socialismo, tal como a filosofia hegeliana, dissolveu-se, porque às suas teorias orgânicas não soube uma teoria forte e verdadeira da justiça. (Justice, Progrès et Décadence.)O homem, por mais que aumente o círculo das suas ideias e da sua sabedoria, não passará nunca duma centelha que passeia na noite imensa que o envolve... As questões económicas, tão importantes como se apresentem, não são suficientes para a nossa inteligência contemplativa e cheia de ternura... É-nos preciso, para a nossa alma, qualquer coisa mais do que o número e a medida, qualquer coisa para além da própria ideia... (Mélanges, I.)É preciso que façamos de novo, da moral, qualquer coisa como um culto. Podemos... apresentar uma teoria, definir o direito, formular as suas aplicações... mas com isso encher o coração, a alma, nunca! É-nos precisa outra coisa... A razão pura e filosófica não basta; nem mesmo aos raciocinadores e aos filósofos. (Pornocratie, notas e pensamentos.)É preciso fazer sair a caridade da justiça, tal como uma flor do seu caule. (Contrad. Écon., cap. VIII.)A justiça, por melhor que a expliquem, permanece sempre um mistério, tal como a vida. (De la Pornocratie, notas e pensamentos.)Se o misticismo é indestrutivel, há um nome que o resume e que ninguém poderia apagar do pensamento dos homens: é o nome de Deus. Iria eu, estupidamente, fazer guerra a este conceito, de que não sou mestre? Que infantilidade! Antes de desonrar a nossa filosofia com esta ridícula negação. como esqueceria eu que a revolução apresentou, entre os seus dogmas, ao lado do progresso, a tolerância? (Justice, Sanction Morale.) Honremos em toda a fé religiosa, em toda a Igreja... honremos, mesmo no Deus que ela adora, a consciência humana. Conservemos a paz, a caridade, com as pessoas a quem esta fé é querida. É o nosso dever. (Justice, Posit. du Pr. de la Justice.)É notório que a humanidade crente vê coisas que a humanidade erudita não percebe; ela concebe, raciocina e julga de outro modo. Ela conclui de maneira diferente... Reside ai a grande cisão moderna.Para tornar a sociedade possível, é preciso que uns - os incrédulos - façam um esforço de tolerância, enquanto que os outros - os devotos - farão um esforço de caridade.Devemos todos reconhecer, de boa fé, o que somos, e aceitar a nossa situação; respeitar-nos uns aos outros, e socorrer-nos mutuamente, como se fossemos simultaneamente, e a um mesmo grau, eruditos e crentes, devotos e justiceiros. (Jésus.)PROFISSÃO DE FÉNão criamos de modo nenhum uma Igreja, não formamos, falando com propriedade, um partido. Não trazemos ao mundo uma doutrina feita, à maneira dos reveladores, dos filósofos do absurdo e de alguns reformadores contemporâneos. Não somos o representantes de qualquer opinião, de qualquer interesse de corporacão ou de classe. O nosso principio é velho como o mundo, vulgar como o povo: é justiça e nós tentamos fazer um comentário a se respeito, que outros continuarão depois de nós e qu jamais terá fim... (Justice, Position du probl. de la Justice.)Apresentei alguns pontos de partida. Não esperem de mim que vos dê um sistema...O meu sistema é o progresso, isto é, a necessidade de trabalhar incessantemente na descoberta do desconhecido...Esta teoria, longamente desenvolvida, do progreso, que excluirá... todas as hipóteses intituladas como definitivas, é aquela que... deve fornecer a base sólida e no entanto mutável do futuro. É ela que porá a sociedade a coberto da preguiça conservadora bem como dos falsos cometimentos revolucionários. (Lettre à Langlois, Dez. de 1851.)... Somos quase ignorantes quanto ao futuro. A nossa previsão não vai mais longe que a antítese que o presente nos sugere...Nunca conheceremos o fim do direito, porque nunca cessaremos de criar entre nós novas relações. (Justice, Position du Problème.)Sem dúvida que a sociedade se aperfeiçoa à medida dos progressos da ciência e da economia: mas, em nenhuma época da civilização, o progreso implica uma metamorfose como aquela que os fabricantes de utopias sonharam; e, por mais excelente que deva ser a futura condição da humanidade, nem por isso será menos a continuação natural, a consequência necessária das suas posições anteriores. (Contr. Écon., cap. VIII.)Não obstante as teorias, o progresso das ideias muda sem cessar a forma exterior das instituições... As questões de impostos tornam-se questões de repartição, as de utilidade pública, questões de trabalho nacional e de organização industrial; as de finanças, operações de crédito ... (Contr. Êcon., cap. IV.)É então sobre nós próprios que devemos agir se queremos influenciar o destino do mundo...A humanidade é progresiva ... Ela age a partir de recordações e de previsões... É o povo quem, com o tempo... modifica, reforma, absorve os projectos de política e as doutrinas dos filósofos e quem, criando sem cessar uma realidade nova, muda incessantemente as leis da política e da filosofia. (Confes. d'un Révol., cap. II.)Não caminhamos para uma perfeição ideal, para um estado definitivo, que dependerá de nós ser alcançado em dada altura, transpondo, pela morte, o intervalo que ele nos separa. Somos arrastados juntamente com o universo, numa metamorfose incessante, que se realiza tanto mais seguramente e gloriosamente quanto nela desenvolvermos, nós próprios, mais inteligência e moralidade. O progresso fica então a ser a lei da nossa alma, não unicamente no sentido em que, pelo aperfeiçoamento de nós próprios, nos devemos aproximar incessantemente da justiça absoluta e do ideal; mas no sentido em que a humanidade, renovando-se e desenvolvendo-se sem fim, como a própria criação, contribui para que o ideal de justiça e de beleza que queremos atingir mude e cresça sempre...O pequeno número de dias que nos é dispensado não importa para o caso: a nossa perpetuidade está na perpetuidade da nossa raça, ligada ela própria à perpetuidade do universo. Então mesmo que o globo em que vivemos... aluísse debaixo dos nossos pés e se dispersasse no espaço, não deveríamos ver nesta dissolução senão uma metamorfose local... Depois de nós, outros mundos!... Esta ideia estaria acima dos ingénuos ou abaixo dos filósofos? ... (Justice, Philos. Popul.)Resta saber se esse fim da Humanidade exprimirá a abertura de novas relações entre o homem e o universo. Sob o ponto de vista do infinito, já só se trata das relações entre um mundo e um outro e isso no infinito, até que o ser-homem e o Ser-Deus se contenham, numa síntese suprema.Ou na verdade a finalidade do homem não é a sua reconciliação definitiva com Deus e a sua passagem do tempo à eternidade?...Por conseguinte, é preciso admitir que nós que morremos hoje e que, apesar disso, não podemos ser suprimidos da humanidade, tanto no seu fim como no seu começo -somos, por assim dizer, conservados para esta transição sobrenatural. Mas onde, quando, como, o que subsiste de nós, quando pela morte o eu e o não-eu, o Ser inteiro desaparecer Mistério sem dúvida, mas mistério não absurdo... A ideia de imortalidade esconde pois uma realidade realizável mas não demonstrável pelo menos no estado dos nossos conhecimentos. (Carnets, 5, 24 de Maio de 1847.)Eis, Senhores, a minha profissão de fé. Nunca a tinha escrito: confesso mesmo que raramente tenho reflecido sobre ela. Levado na onda do meu século, eu ia diante de mim, sem nunca me voltar, confírmando o movimento, procurando a integralidade das minhas ideias, negando as concepções analíticas, defendendo a identidade da antologia e da lógica, colocando a liberdade acima da própria religião, defendendo, em nome da justiça, a causa do salariato e do pobre, defendendo a igualdade, ou melhor, a equação progressiva das funções e dos destinos; além disso, acreditando pouco no desinteresse, tendo, apesar da minha prisão, o martírio em medíocre estima, pensando que a amizade é frágil, a razão vacilante, a consciência duvidosa; e considerando a caridade, a fraternidade, o trabalho atraente, a emancipação da mulher, o governo legitimo, o direito divino, o amor perfeito e a felicidade, como disfarces do Absoluto.Se em qualquer parte, sem eu saber, pela violência da polémica, pela má fé do espírito de partido, ou por outra qualquer razão, fui infiel a esta doutrina, foi um lapso calamitoso da minha parte, um argumento ad hominem, uma fraqueza de espírito ou de coração, que renego e desdigo... (Philos. du Progrès, 1ª carta.)Esqueço os meus antigos livros e não me releio mais. Com tais hábitos, devem-se encontrar, frequentemente, em mim coisas de conciliação difícil. (Lettre à Clerc, 4 de Março de 1863.)Por certo eu teria mais do que uma expressão incorrecta, a substituir, se fizesse uma edição completa das minhas obras e fosse minha intenção ter tudo em harmonia... Afirmo, porém, que tudo mim se encadeia, se sucede e se justifica... (Lettre à Clerc, 14 de Março de 1863.)