P. J. PROUDHON, K. MARX E L. L. ZAMENHOF
Esta contribuição poderia conter um sub-título: “História de um contrasenso.”Pierre-Joseph Proudhon, Karl Marx e Louis Lazare Zamenhof foram contemporâneos, mas serão eles reencontrados? As obras de uns e de outros sofreram influências mútuas? Para Proudhon e Marx sabe-se que se pode responder pela afirmativa, mas e por Louis Lazare Zamenhof?Primeiramente algumas datas. Em termos seguros as suas biografias podem resumir-se em seis datas:P. J. Proudhon: 1809-1865K. Marx : 1818-1883L. L. Zamenhof: 1859-1917Quando Zamenhof nasce, Proudhon tem cinquenta anos e Marx tem quarenta e um. Eles são efectivamente contemporâneos, mas encontram-se sobretudo cruzados. Apesar do aparecimento da primeira brochura tratar de Esperanto, a 25 de Julho de 1887, Proudhon é morto 22 anos antes e Marx 4 anos. Nem um nem outro têm portanto hipótese em se pronunciarem sobre este assunto. L.L.Zamenhof, é ainda um homem novo com quase 28 anos. Mas curiosamente, até este dia, essencialmente no movimento esperantista, as alusões a Proudhon e Marx são constantes sobre o tema preciso da língua universal.Estes dois homens, pares do século XIX, prestaram verdadeiramente um interesse de algum modo a este conceito?É o sujeito central desta contribuição?Um exame, mesmo superficial, das suas obras, não permite revelar uma preocupação evidente para este sujeito. Isto não é para surpreender-nos.Mesmo depois do tempo dos pensadores iminentes (Decartes, o pai Mersenne, Leibnitz, …) serem inclinados sobre a ideia da criação de uma língua auxiliar utilizável à escala do globo, o príncipio do século XIX (do qual fazem parte Marx e Proudhon) preocupa-se mais com o desenvolvimento económico, do maquinismo, das transformações sociais, continuações da Revolução Francesa. A ideia de uma língua de comunicação internacional aparecerá sobretudo no fim do século com a explosão dos meios de comunicação (caminhos-de-ferro, barcos a vapor, telégrafo, etc.).Na época de Proudhon e de Marx, o obstáculo linguístico é contornado pela frequente utilização divulgada… do Francês!E assim os esperantistas continuam a falar de Marx e de Proudhon sob um ângulo linguístico. Para melhor compreender este paradoxo, façamos uma pequena excursão pelo microcosmo constituído pelo movimento esperantista.Nascido em 1887, o Esperanto tem hoje em dia (em 2001) mais de cem anos. Desde as suas origens, há centenas de milhões de homens que estudaram (ou começaram o seu estudo…), mais de 40.000 volumes foram editados em cinco continentes, centenas de publicações apareciam regularmente e dezenas de milhares de reencontros, regionais, nacionais e internacionais têem desde os primeiros balbuciamentos reunido legiões de partidários convencidos.Apesar destes impressionantes números, o movimento esperantista permanece bastante marginal e pode-se estimar os seus locutores entre algumas centenas de milhares (hipótese base), a alguns milhões (hipótese alta). Mas estes são persuadidos que o futuro lhes pertencerá… As recentes propostas de Umberto Eco no jornal Le Monde (29 Setembro 1992, pág. 2) mostram que o seu optimismo não é talvez sereno.Sem conhecer os sucessos fulminantes ou os espectaculares enfraquecimentos, o movimento esperantista, muito diverso nos seus componentes, mantem-se com uma saúde robusta, e constitui um dos fenómenos culturais originais do nosso tempo.Este movimento subdivide-se numa multiplicação de associações bastante variadas. Alguns retirarão a nossa atenção. Os que re-agrupam os membros do movimento operário organizado.Para não alongar esta contribuição, indiquemos que desde o impulso do movimento esperantista, os operários, os intelectuais tinham o “coração à esquerda” viram o interesse capital de uma língua internacional para o seu combate político ou sindical.Mesmo antes de 1914 uma primeira associação de vocação mundial, Liberiga Stelo (Pétala Libertadora) cria-se e encontra a sua forma definitiva em 1921 aquando um congresso em Praga pela criação do S.A.T. (Associação Universal Anti-nacional). Tal como no resto do meio social, o movimento operário esperantista vai conhecer os golpes, os conflitos que afectam o movimento operário geral: sociais-democratas, estalinistas, anarquistas, etc… coabitam amargamente. Neste sub-grupo, um sub-sub-grupo, o dos marxistas-esperantistas (muito ortodoxos devido à linha do P.C.U.S. – Partido Comunista da União Soviética) vai conhecer diversos azares. Entre outros na Rússia, apartados entre a sua fidelidade a Estaline e o seu desespero de ver o seu grande homem favorável à expansão do russo, muitos vão acabar no goulag apesar dos processos de Moscovo. Mas contra ventos e marés, eles vão conservar a sua confiança nas duas principais pessoas que baseam a sua acção: Marx e Zamenhof. O que nos conduz ao principal sujeito desta constituição.Na morte de Proudhon, a 19 de Janeiro de 1865, Johann Baptist von Schweitzer, redactor de Der SozialDemokrat, orgão da sociedade alemã geral do trabalho, aparecia em Berlim, obriga Karl Marx a enviar-lhe uma notícia necrológica. Este redigirá uma carta que aparecerá nos números 16, 17, e 18 do SozialDemokrat, dias 1, 3, e 5 de Fevereiro de 1865 ( esta carta será retomada nas edições alemãs da “Miséria da Filosofia” em 1885 e 1892 ).Que continha esta famosa carta? Entre outros, este parágrafo; traduzido pelo marxista-esperantista alemão ( ex-R.D.A. ) Detlev Blanke:“Eu não me sigo pelos primeiros ensaios de Proudhon. A sua memória escolar no sujeito da “Língua universal” mostra que sem complexo ele tratou um problema para a solução da qual lhe faltavam os conhecimentos elementares.”Destacar-se-á a passagem da lendária cortesia de Marx quando ele fala dos seus contemporâneos… Em toda a obra ( vasta ) de Marx, procurar-se-à em vão uma outra alusão a este problema da “língua universal”. Ele está portanto pronto a ser abusivo extrapolando-o, a partir desta frase insignificante, um interesse qualquer da parte de Karl Marx para este conceito.Mas ele agita-se lá com um comportamento humano muito compreensível. Os marxistas-esperantistas, sinceros propagandistas de Espérauto, entregam a eles próprios a ilusão que o seu grande homem teria apoiado a sua adesão a esta “língua universal” que é, por natureza, a obra do Dr. Zamenhof. Que nem por um dia se sentiu tentado em solicitar uma frase inofensiva…Mas Proudon, estará ele efectivamente, como o pretende Marx na sua carta, interessado na problemática da “língua universal”? Lá nós estamos em terreno mais conhecido, mas eis, completamente em redor do sujeito! Como cada um sabe, Pierre-Joseph Proudon tinha recebido até aos 17 anos uma educação clássica muito sólida, ao ponto de ser capaz de escrever tão bem em latim como em francês. De 1826 a 1838 ele vai, sózinho, prosseguir o estudo das línguas ancestrais entre outras, a sânscrita e a hebraica. Mas sobretudo durante este período de doze anos ele vai trabalhar, quer com os irmãos Gauthier, quer com o seu amigo Lambert, no mundo da edição e singularmente como corrector. Com este título ele vai ler – e corrigir – em francês, hebraico e latim, as obras religiosas monumentais, entre as quais a Bíblia Sagrada Comum. Ele vai igualmente corrigir e imprimir as obras consagradas à linguística. é o período da vida de Proudon onde ele se vai apaixonar pela teologia ( o que deixará em si os traços profundos e definitivos ) e o estudo das línguas ( que ele abandonará seguidamente ).Uma das grandes questões desde o ínicio do século XVII é efectivamente a “língua universal”, mas no sentido da língua primitiva, da língua adâmica, dada por Deus a Adão, língua perfeita e racional, nas quais as línguas contemporâneas não são mais que descendentes abastados. Á unidade da Génese devia corresponder na cosmogonia cristã a unidade da língua dos primeiros homens. Inúmeros trabalhos tinham tentado reencontrar, a partir das línguas existentes, esta língua original… e universal por natureza. Da “Gramática Geral e Racional” destes mensageiros de Port-Royal ( 1660 ) aos “Princípios gerais da gramática para todas as línguas” de Condillac ( 1798 ), as procuras não tinham faltado. Diante do interesse traduzido pelo público para estas questões, Proudhon e os seus associados decidem reeditar em 1837 uma obra clássica do pastor Bergier, reedição contendo o seguinte título completo: “Os elementos primitivos das línguas, descobertos pela comparação das raízes do hebraíco com as do grego, do latim e do francês, por Bergier. Nova edição argumentada de um Ensaio de gramática geral, pelo impressor-editor.”Notar-se-á que o nome do autor deste Ensaio não está indicado. Mas o anonimato é transparente e as biografias de Proudhon atribuem-lhe no geral a paternidade desta obra.Em 1839 Proudon apresentará uma versão modificada deste Ensaio ao Instituto de França pela obtenção do prémio Volney, mas desde 1842, ele vai desinteressar-se do sujeito e vai mesmo re-negar esta primeira obra, pois ele está consciente que a sua teoria sobre a língua primitiva não está suficientemente fundada. Poder-se-á destacar, entre parentesis, que quase dois séculos mais tarde, de Chomsky a Dumenzil, nós não avançamos em nada…Mas regressemos a Proudhon. Destacar-se-à que no título de Ensaio ele não faz alusão à “língua universal”, mas à gramática geral.Mas Karl Marx não elabora contrasensos quando ele fala de uma obra consagrada na “língua universal”. É exactamente isso que ele agita, mas no sentido da língua primitiva.É portanto abusivamente, mas sem nenhuma maldade, que as publicações esperantistas, e particularmente as do corrente marxista-esperantista, citam Karl Marx e Pierre-Joseph Proudhon entre os “percurssores”.Excepto se, não tendo pena de fazer um contrasenso à nossa volta sobre as intenções de Proudon, nós pretenderíamos que ele esperasse que a descoberta da língua primitiva poderia ser seguida da sua aplicação como língua veículadora mundial. Mas eu penso que ele não disse nada de semelhante.Pode surpreender-se e deplorar que Proudhon e Marx sejam postos de lado de um problema não-negligenciável, o da comunicação mundial. Mesmo que se possa espantar, e deplorar, Zamenhof havia mostrado pouco interesse para os problemas políticos.
<< Home